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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

GEOGRAFIA BIBLICA

GEOGRAFIA BÍBLICA

Geografia é a ciência que descreve a superfície de uma região, seus acidentes físicos, climas, solos e vegetações, assim como as relações das pessoas com esse meio. Ela não explica tudo, mas fornece elementos importantes para que se possa compreender a história, a economia, a organização política, a cultura, enfim, a forma de pensar e viver de um povo.
A Bíblia descreve sua geografia com palavras poéticas e idílicas: “a terra que mana leite e mel” (Ex 3.8; 13.5; 33.3; Lv 20.24; Nm 13.27; 14.8; 16.13,14; Dt  6.3; 11.9; 26.9,15; 26.15; 27.3; 31.20; Js 5.6; Jr 11.5; 32.22; Ez 20.6,15). Quem não conhece a região, pode ser traído por essa expressão. Com algumas poucas exceções, a paisagem é sóbria, com colinas, montanhas pedregosas, vegetação pobre, grandes áreas semi-desérticas ou desérticas. A expressão só adquire sentido para quem procede do grande deserto siro-arábico. Foi a partir dessa perspectiva que os israelitas viram a terra prometida, depois de vagar pelo duro deserto.
O território bíblico é conhecido por diversas expressões: a) Terra de Canaã ou Canaã: A Bíblia emprega esse nome quando a terra era só uma esperança e uma promessa. Por isso ele aparece nada menos que 78 vezes de Gênesis a Juízes (p.ex.: Gn 12.5; 13.12; 37.1; Nm 13.2; Js 17.12; Jz 1.9,27). Depois que os textos bíblicos descreveram a ocupação do território pelos filhos de Israel, esse nome é utilizado só raramente (11 vezes em Sl, Is, Ez, Os, sempre como referência ao passado). O nome deriva de Canaã, quarto filho de Cão e neto de Noé. Etimologicamente significa “habitante de terras baixas”, indicando sua preferência por planícies. São os antecedentes dos fenícios (a Fenícia é conhecida no Novo Testamento como “os lados de Tiro  Sidom”). Por referir-se apenas à região costeira do Mar Mediterrâneo, o nome não combina com o restante do território, muito menos com a Transjordânia, do outro lado do rio Jordão.
b) Terra de Israel: A expressão hebraica ‘erets Israel, utilizada na literatura rabínica e consagrada pelo moderno Estado sionista, não aparece mais que onze vezes na Bíblia (1 Sm 13.19). Após o cisma entre o sul e o norte, designava apenas o reino do norte. A expressão hebraica ‘admat israel, usada dezenove vezes em Ezequiel, designa o solo da terra santa privado de seu povo e da presença divina.
c) Terra de Judá ou Judéia: A princípio, referia-se apenas à area que coube à tribo de Judá. Após a divisão do reino, o termo englobou a território de Benjamim, formando a reino de Judá. Quando o povo voltou do cativeiro babilônico e reorganizou a vida nacional, o nome passou a designar todo o território compreendido na bênção de Jacó (Gn 49.8-12) e seus habitantes passaram a ser chamados de “judeus”.
d) Terra prometida ou terra da promessa: Baseado na promessa feita a Abraão em Gn 12.1-4, esse nome é usado pela tradição judaica, cristã e até muçulmana. A expressão “a terra que Javé jurou dar a vossos pais” aparece 15 vezes em Deuteronômio (1.8; 6.10; 6.23; 28.11; 29.13).
e) Terra Santa: Baseado em Zc 2.12, o nome foi adotado por cristãos da Idade Média (Ex 3.5; 1 Sm 13.19; Zc 2.12).
f) Palestina: O termo não aparece na Bíblia como designação da terra. Fora do ambiente judaico, é hoje a designação mais comum. O nome foi utilizado pelos romanos para designar a província da Judéia após a rebelião judaica liderada por Bar Kochba nos anos de 132 a 135. Generalizou-se no período bizantino, quando foi tomado da linguagem administrativa do Império Romano. Os romanos tomaram a expressão de Heródoto (falecido por volta de 425 a.C.), historiador da Ásia Menor conhecido como “o pai da história”, que chama de Síria-Palestina, ou simplesmente Palestina a região que vai desde a Fenícia até o Egito. Etimologicamente, Palestina provém de palastu ou peleshet, que é o nome que recebe o país dos filisteus em documentos assírios do sétimo século antes de Cristo e na Bíblia.
Como se vê, a Bíblia não conhece um nome fixo para designar o país habitado pelos israelitas. A falta de um nome próprio, preciso e constante mostra que, apesar de ser um país pequeno, ele nunca formou uma unidade homogênea bem definida, nem na geografia física, nem na étnica, nem na política. Com raras exceções, a Palestina conheceu a presença simultânea de populações distintas, condicionadas, por sua vez, por forças políticas distintas.             Como não poderia deixar de ser, vamos dedicar a maior parte de nossa exposição ao território que corresponde ao centro dos acontecimentos bíblicos. Mas a geografia bíblica também deve ser descoberta e estudada a partir dos países à sua volta, com quem o povo de Deus compartilha características análogas e dentro dos quais se desenvolveu sua vida. Por isso incluiremos na abordagem a Mesopotâmia e o Egito. À geografia bíblica também pertence, a rigor, o território que circunda a bacia do Mediterrâneo, em especial para o período do Novo Testamento. Mas devido à extensão da matéria, não podemos dar atenção maior a ela.
Além de situar os lugares mencionados na Bíblia, nos propomos nesse texto a estudar a geografia bíblica. As informações que iremos prestar são as que possuem algum interesse para contextualizar e compreender os textos bíblicos. Muitos dados não bíblicos, que de um ponto de vista científico poderiam ter grande importância geográfica, serão omitidos. Junto com detalhes geológicos, topográficos e geográficos, incluiremos também alguns dados históricos do período bíblico (inclusive medievais ou modernos), arqueológicos e até um “guia turístico” da Terra Santa. Em uma palavra: daremos atenção àquilo que possa contribuir para que se tenha um melhor conhecimento do país que serve de cenário para a Bíblia. Observe-se, ao longo do texto, alguns sinais utilizados para orientar o leitor: Palavra sublinhada designa personagens importantes; palavra em negrito: nome de cidade; PALAVRA MAIÚSCULA EM NEGRITO: nome de região; palavra em negrito e sublinhada: nome de povos;  palavra sublinhada em itálico e negrito: rios. O texto apresenta, igualmente, vários links com endereços da internet, que complementam as informações ou as ilustram com imagens.

I - FONTES PARA A GEOGRAFIA BÍBLICA

Situar geograficamente os lugares mencionados na Bíblia nem sempre é uma tarefa fácil, em especial quando não restaram vestígios claros de sua localização. Por isso a pergunta pelas fontes da geografia bíblica é uma questão importante.

1.1 - FONTES ANTIGAS
O mapa mais antigo da região bíblica é um mosaico do ano 600 d.C. Trata-se de uma obra feita para decorar o piso de uma igreja bizantina, na cidade de Madeba, próxima ao monte Nebo, na atual Jordânia. A obra representa a Terra Santa, desde o Líbano até o Egito, incluindo Israel/Palestina, a Transjordânia e o Sinai. Ela detalha montanhas, rios, vales, cidades, ruas e até locais de banho e pesca no rio Nilo. Dos 94 m² do painel original, somente 25 m² estão preservados. Sua importância é enorme para o estudo da arte, história e topografia dos tempos bíblicos. Só a seção relativa à cidade de Jerusalém tem 156 referências a fatos e lugares citados no livro sagrado - por exemplo, a indicação precisa dos locais do Santo Sepulcro e da Via Cardus Maximus. O mosaico foi descoberto acidentalmente em 1897, durante a construção da nova Igreja Ortodoxa Grega de São Jorge sobre as ruínas de um templo bizantino. Atualmente, é uma atração turística internacional (http://www.christusrex.org/www1/ofm/mad/index.html).
Outro mapa muito antigo é o Tabula Peutingeriana. Trata-se de mapa mundial com vias de comunicação, reduzido a uma tira de uns 8 metros de comprimento por 0,33 de lagura, dividida em doze seções. Cobre a Europa, partes da Ásia e o norte da África. O original poderia ser do século III d.C., mas a cópia que chegou até nós é de 1265. Este mapa, que deve seu nome a Konrad Peutinger, se conserva atualmente na Biblioteca Nacional de Viena (http://www.romancoins.info/Tabula-Peutingeriana.html).
As origens do mapa bíblico, no sentido de listas de cidades, se situam no antigo Egito, pois ali se encontram relações de cidades palestinenses escritas sobre fragmentos de cerâmica, sobre tabletes de argila e em muros de construções. Até 1900 a.C. escreveram-se certos nomes de cidades cananéias em cerâmica. Os vasos dos quais provêm a cerâmica, destinados a serem quebrados no curso de uns ritos mágicos de maldição, foram achados por volta de 1930 e recebem o nome de “textos de execração”        (http://pt.wikipedia.org/wiki/Textos_de_Execra%C3%A7%C3%A3o). 
No período que segue a 1370 a.C., numerosos príncipes de Canaã escreveram ao faraó egípcio pedindo ajuda para defender suas cidades contra uns saqueadores chamados habiru (‘apiru). Estas cartas, chamadas de el-Amarna e encontradas em fins do século passado, têm grande importância para se conhecer a situação geográfica e política da Palestina no período imediatamente anterior a Moisés e Josué.   (http://pt.wikipedia.org/wiki/Cartas_de_el-amarna). Os faraós Ramsés II (1290-1224) e Sesonq (ca. 920; Sisaque em 1 Rs 14.25) também deixaram importantes listas geográficas em monumentos do sul do Egito, sobretudo em Luxor.
Vêm em seguida as listas de cidades que nos oferece o próprio AT e o NT. Estas listas e textos representam uma grande contribuição para geografia bíblica. Incluem textos como Js 13-21 (listas de cidades de várias tribos); Gn 10 (lista de povos); 2 Cr 11.6-10 (cidades fortificadas) e os “oráculos contra as nações “ dos Profetas Maiores (p. ex. Is 13-23; Jr 46-52; Ez 25-32). Também os textos do Novo Testamento, em especial os evangelhos, Atos dos Apóstolos e o livro do Apocalipse, fornecem informações importantes para a geografia da Terra Santa e do Império Romano.
Numerosas informações são dadas, além disso, por autores clássicos como Heródoto, Estrabão, Plínio, Josefo e o geógrafo Ptolomeu. A obra mais importante da antiga topografia palestinense é o Onomasticon de Eusébio, do ano de 330 d.C., um amplo estudo geográfico-histórico da Terra Santa. Em A. Neubauer, Géographie du Talmud e em Eretz-Israel Annual, 2 e Atlas se recolhem importantes observações geográficas do judaísmo pós-bíblico. G. Le Strange, R. Dussaud e A. S. Marmardji têm publicado notícias procedentes de geógrafos árabes. São também importantes os dados trazidos por peregrinos e pelos cruzados, especialmente no que se refere a lugares do NT. Uma dessas peregrinas, chamada Etéria, deixou em suas obras muitas informações geográficas e um verdadeiro painel da vida da Igreja na Terra Santo do fim do século IV. O fino senso de observação dessa devota e perspicaz peregrina legou à posteridade um documento valioso que merece ser apreciado por todos os cristãos (confira o livro traduzido por Frei Alberto Beckhauser, A Peregrinação de Etéria. Petrópolis: Vozes, 2005). Desgraçadamente se mostrava aos peregrinos, com muita freqüência, umas localizações que respondiam mais aos itinerários principais que as notícias transmitidas por fontes históricas.

1.2 - FONTES MODERNAS

A confecção de mapas da Palestina alcançou seu apogeu em meados do século XIX. Em 1838, o clérigo de Boston, E. Robinson, durante uma viagem pela Terra Santa que durou três meses, em companhia do missionário Eli Smith, que falava o árabe, localizou mais lugares palestinenses que os que haviam sido descobertos desde os tempos de Eusébio. O êxito sugeriu a criação do British Palestine Exploration Fund e o seu Survey of Western Palestine com seis volumes.
Este trabalho está na base dos principais mapas atualmente em uso. Os principais são: o Topocadastral Survey, o Westminster Historical Atlas, o mapa da National Geographic, o Geographie de Abel, assim como os mapas de M. Avi-Yonah e de G. Blake.
Uma advertência quanto aos mapas: Todo mapa bíblico leva implícito um juízo acerca da identificação dos lugares, especialmente sobre a relação dos modernos nomes árabes de lugar e os antigos nomes citados na Bíblia. Uma geografia científica da Palestina não pode prescindir de uma constante confrontação com os nomes populares de lugar preservados na língua árabe. Também é preciso ter em conta a dificuldade de transcrever os nomes hebreus e árabes para outras línguas. Via de regra utilizaremos a grafia utilizada pela versão de Almeida da Bíblia.

II- GEOGRAFIA DOS PAÍSES CIRCUNVIZINHOS

2.1  O CRESCENTE FÉRTIL

O território bíblico é parte de um conjunto geográfico que por causa de sua configuração recebeu o nome de “Crescente Fértil” (J.H.Breasted). Trata-se de um arco verde em forma de lua crescente, com cobertura vegetal apreciável e duradoura, cujas pontas estão na Mesopotâmia, no Oriente, e no delta do rio Nilo, no Ocidente (http://pt.wikipedia.org/wiki/Crescente_F%C3%A9rtil). O corpo do arco passa entre os rios Tigre e Eufrates e nas costas orientais do Mar Mediterrâneo. O Crescente Fértil é irrigado por rios mais ou menos importantes: Tigre, Eufrates (Iraque), Orontes (Síria), Litani (Líbano), Jordão (Palestina) e o delta do Nilo (Egito). A margem externa do crescente é constituída pelos maciços montanhosos do planalto iraniano, da Armênia e do Taurus. A margem interna é formada por regiões semi-desérticas que fazem a transição para o grande deserto Siro-Arábico. A Síria e a Palestina formam a parte mais estreita desse crescente: entre o deserto e o Mediterrâneo, um corredor de menos de cem quilômetros de largura faz a ligação entre a Mesopotâmia e o vale do Nilo.
      Na área do Crescente Fértil ou em suas imediações desenvolveram-se algumas das civilizações mais famosas da antigüidade, como a suméria, a babilônica, a assíria, a persa, a egípcia, a hitita. Comparadas com outras culturas, as civilizações do Crescente Fértil mostraram, muito tempo antes do que em outras partes do mundo, um desenvolvimento singular, pelo fato de ter ocorrido ali alguns fenômenos culturais da máxima importância. Um deles é a revolução neolítica (ca. 7-8 mil anos a.C.). (http://greciantiga.org/his/his03-3a.asp)(http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/humanas/historia/tc2000/hisger1.pdf: aula sobre o período pré-histórico). Ela consistiu na descoberta da técnica da produção de alimentos. Enquanto que o ser humano do período paleolítico vivia da caça e da coleta de produtos, no período neolítico a humanidade tornou-se capaz de produzir sua alimentação, seja através da domesticação de animais e da criação de rebanhos, seja através da “domesticação” das plantas, pelo cultivo de cereais, leguminosas e frutas. Outras inovações vieram complementar a anterior, como a descoberta da cerâmica (6000-4000 a.C.), de suma importância para a vida cotidiana, e dos metais (5000-1000: cobre, bronze, ferro), importantes como instrumentos de trabalho e armas de guerra. Um segundo fenômeno cultural importante ocorrido no Crescente Fértil foi a “revolução urbana” (a partir de 3000 a.C.), que transformou as aldeias em cidades-estado e criou as condições para outras descobertas.
      Demos inicialmente alguma atenção à margem interna do Crescente Fértil, formada pelo DESERTO SIRO-ARÁBICO. Trata-se de um dos maiores desertos do planeta. Abrange a maior parte da península arábica, assim como enormes superfícies dos atuais Estados da Jordânia, da Síria e do Iraque. Seu índice de pluviosidade fica abaixo dos 100 mm. anuais e no verão a temperatura chega a 50 graus à sombra. Na costa do Mar Vermelho, a península arábica tem cadeias de montanhas cuja altura pode chegar a 3.900 metros no Iêmen. A partir dessa cordilheira para o interior do deserto, as terras são geralmente planas e argilosas, às vezes cobertas de pedregal, outras vezes por solos arenosos com dunas.
O deserto não é completamente estéril. Quando a chuva cai em alguns invernos, as águas formam rios temporários (wadis), às vezes de poucas horas, no leito dos quais aparece depois uma vegetação estacional, que é o segredo da vida no deserto. Para ali vão os beduínos com seus rebanhos, cuja subsistência depende ao mesmo tempo do conhecimento de poços, que nunca faltam no deserto e que fornecem a água para as pessoas e animais. Não é raro que em torno de poços se formem oásis com vegetação abundante (http://www.voyagevirtuel.com/jordanie/jordanie-wadi-rum_53.php).

2.2  – ABRAÃO E O CRESCENTE FÉRTIL

A geografia bíblica não começa na Palestina, e sim, no vale do rio Eufrates,  (http://www.arabias.com.br/cultura/civilizacao.htm), na extremidade oriental do Crescente Fértil. Os mais antigos nomes de lugar identificados na Bíblia são os que guardam relação com Abraão, em Gn 11.31, concretamente, Ur e Harã. A existência de água nesta região determinou o estabelecimento de centros agrícolas ou “sedentários”, condicionando ao mesmo tempo o traçado das rotas comerciais utilizadas para o trânsito entre as grandes zonas exportadoras. Veremos como os movimentos de Abraão coincidem com a mais importante rota de caravanas que unia os dois extremos do Crescente Fértil, a Babilônia e o Egito.
No extremo babilônico da lua crescente se encontrava Ur (http://pt.wikipedia.org/wiki/Ur), que a Bíblia identifica como o lugar de origem de Abraão (Gn 11.28-31). Alguns investigadores põem em dúvida a exatidão desta notícia. De fato, não se menciona Ur na passagem correspondente da LXX em Gn 11.28,31. Porém, mesmo que Abraão fosse oriundo de Harã, no noroeste do vale, é provável que antes tivesse viajado para Ur, a sudeste, centro cultual máximo para a antiguidade.
Esta região da bacia do rios Tigre e Eufrates, perto do Golfo Pérsico, é chamada de TERRA DE SINEAR em Gn 10.10. Isto significa país dos sumérios, antigos ocupantes não semitas daquela região. Perto de Ur se encontra Uruk, a Ereque de Gn 10.10 (atual Warka), cujo rei Gilgamesh (ca. 2800 a. C.) se converteu em herói de uma lenda sobre o dilúvio. Das escavações nesta localidade procedem os mais antigos testemunhos conhecidos da escrita, o que sugere que este importante avanço cultural pudesse ter-se originado naquela região.
A partir de 2500a.C., os amorreus semitas (‘ocidentais”, por proceder do sul da Arábia ou da Síria, ao noroeste) começaram a invadir o antigo território dos sumérios. A mais antiga das dinastias estabelecidas nesta região teve seu centro em BABILÔNIA, uns 250 km ao noroeste de Ur, onde se construiu um famoso zigurate, um templo em forma de torre, com uma série de plataformas escalonadas de ladrilho (confira Gn 11.4-9: a torre de Babel) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Zigurate). A presença de Abraão em Ur é freqüentemente associada às ondas de imigrantes amorreus que invadem a Suméria. Chegou-se a pensar que Abraão seria contemporâneo de Hamurabi (http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Hamurabi), o mais importante dos monarcas babilônicos (ca. 1700), erroneamente identificado como o Anrafel de Gn 14.1.
Passado um milênio, Babilônia voltaria a ocupar um lugar importante na história israelita, quando Judá foi levado para o cativeiro babilônico (598 e 597 a.C.) (http://www.painsley.org.uk/re/Atlas/babylemp.gif) (http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/humanas/historia/tc2000/hisger4.pdf: aula sobre a Mesopotâmia; excelente site com aulas sobre história: basta alterar o número após hisger para acessar as outras aulas).
 Em virtude de um destes contatos com o país babilônico, Israel se familiarizou com a mitologia suméria da criação, o poema Enuma Elish, do qual se podem tomar algumas imagens de Gn 1-2.  (http://www.klepsidra.net/klepsidra23/gilgamesh.htm).  O jardim do Éden, de Gn 2.10-14, é concebido como um lugar úmido na confluência dos rios Tigre e Eufrates, que aos parentes de Abraão, descalços e empoeirados, recém chegados do deserto arábico, devia parecer um verdadeiro paraíso.
Bem ao leste da região descrita fica a região montanhosa da PÉRSIA , cujo rei, Ciro, seria o libertador dos judeus em 538, ao pôr fim ao cativeiro que estes haviam sofrido na Babilônia (http://www.painsley.org.uk/re/Atlas/persemp.gif). O ambiente cortesão da Pérsia e a religião deste povo, o zoroastrismo, formam parte do cenário dos últimos livros do AT: Neemias, Ester, Daniel.
Em sua viagem para o noroeste desde Ur, Abraão seguiu a rota que se estende entre Mari e Nuzi. Em cada um destes centros, as escavações mais recentes têm dado a conhecer milhares de documentos em tábuas de argila (só em Mari são cerca de vinte mil), que ajudam a explicar muitas das tradições patriarcais de Gênesis. A história de Mari, situada junto ao rio Eufrates, está ligada ao nome de Hammurabi. Perto dos modernos campos petrolíferos de Kirkuk, se encontra Nuzi. Entre esta e Harã se estendia antigamente a região chamada Mitanni. Seus habitantes se chamavam hurritas (http://pt.wikipedia.org/wiki/Usu%C3%A1rio:Lenicio), que aparecem na Bíblia possivelmente com o nome de  hiveus ou hititas. Seus documentos de negócios, que refletem o comércio que mantinham com mercadores assírios, servem igualmente para ilustrar muitos costumes bíblicos da época patriarcal.
Harã, identificada na Bíblia como o lugar em que Abraão se assentou depois de ter emigrado de Ur (Gn 11.31), é tida por alguns pesquisadores como o lugar de origem do patriarca (http://pt.wikipedia.org/wiki/Har%C3%A3). As cidades desta região levam nomes que são variantes dos que Gn 11 atribui aos parentes do patriarca: Pelegue (v.16), Serugue (v.20), Terá e Naor (v. 24) e mesmo Harã (v.27).
O extremo do arco que forma o Crescente Fértil avança de Harã até o Eufrates, na direção oeste. No lugar em que o rio cruza a atual fronteira turca se encontra Carquemis  (2 Cr 35.20; Jr 46.2), posto avançado do Império hitita até 900 a. C. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hititas). Em 605 a.C. foi cenário da batalha decisiva liderada por Nabucodonosor contra os assírios.
A partir deste ponto, a rota de caravanas dobra bruscamente para o sul, seguindo a linha Alepo-Hama-Damasco-Jerusalém. Alepo era uma antiqüíssima cidade, conhecida já nos documentos de Mari com o nome de Iamhad (http://pt.wikipedia.org/wiki/Alepo). Junto à costa, a oeste de Alepo, estava a cidade-estado de Ugarit, a moderna Ras Shamra. Os arquivos desenterrados aqui a partir de 1929 demonstram que Ugarit era poderosa o bastante para firmar tratados com o Império hitita, rival do Egito e da Síria. A língua em que estão escritos estes textos, o ugarítico, tem grande importância para o estudo do hebraico primitivo. Outra poderosa cidade-estado, mais ao sul e terra adentro, era Hamate (Gn 10.18; Nm 34.8; Js 13.5; Ez 47.16; 2 Sm 8.9-10), atual Hama. Também Hamate foi palco de batalhas decisivas, já que guardava a saída norte do vale formado pelas cadeias montanhosas do Líbano e do Antilíbano. Esta “entrada de Hamate” é considerada, em alguns textos, como o limite norte da terra prometida (Nm 34.8). Ainda mais antiga e importante era Damasco. Como cidade bem abastecida de água e situada à borda do deserto, era a última oportunidade para aprovisionar as caravanas. Surpreende que a Bíblia, ao descrever o itinerário de Abraão (Gn 12.5), não mencione estes centros, dando um salto de Harã para o centro do país cananeu, isto é, até o lugar que logo receberia o nome de Samaria.
CANAÃ, a terra prometida, era um país pequeno, à borda da ponta sudoeste do Crescente Fértil. Mas ocupava uma posição estratégica entre os estados comerciantes rivais: Arábia a sudeste, Egito à sudoeste, os hititas ao norte e Babilônia ao leste. Considerando as linhas de tráfego e a densidade da população, Canaã pode ser considerada o eixo do Crescente Fértil. Certamente foi o eixo de todo o mundo conhecido desde os tempos de Abraão até os de Alexandre Magno.
Os clãs de Abraão, em sua migração desde a Mesopotâmia, não reclamaram como sua, a princípio, a terra de Canaã. Mas Abraão aparece com direito de assentar-se em Canaã devido às experiências que teve em seus mais importantes centros de culto: Siquem, Betel, Hebrom e Berseba. Na realidade, sua estadia na Terra Santa se reduziu a um assentamento nômade na rota que levava ao término natural da viagem: o Egito. Porém a migração que leva seu nome pode muito bem ter-se desenvolvido em ondas sucessivas ao longo de várias gerações. Vistas assim as coisas, pode-se dizer que ela só terminou após a ida de Jacó para unir-se com José no Egito (Gn 46.7). Resulta assim que a última parte da migração designada com o nome de Abraão se integra naquele movimento que as notícias extra-bíblicas designam como invasão dos hicsos. Hicsos é um termo egípcio que significa “monarcas estrangeiros” (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hicsos). Alude aos imigrantes asiáticos que se instalaram no nordeste do delta do Nilo, e desde sua capital, Avaris, governaram o Egito entre 1700 e 1570. Alguns investigadores modernos opinam que em realidade não se tratou de uma invasão, e sim de uma horda que se foi infiltrando pacificamente. Em sua maior parte eram semitas, se bem que não falta quem sustente que, ao menos no que se refere à sua casta governante, havia também entre eles elementos hurritas. Os parentes de José, portanto, se instalaram na porção nordeste do delta, no território que a Bíblia designa com o nome de Gósen (Gn 47.6). Ali, na ponta sudoeste do Crescente Fértil, ia-se preparando o cenário do Êxodo.

2.3 – MOISÉS: O EGITO E O ITINERÁRIO DO ÊXODO

            O “povo de Deus” bíblico, seja quais forem suas origens, parece que chegou a adquirir consciência de sua unidade nacional devido em grande parte à experiência que muitos de seus componentes tiveram no Egito. É neste ponto que muitos pesquisadores modernos põem o começo da história e da geografia bíblica. Considera-se a história de Abraão essencialmente como um relato de como algumas tribos semitas fizeram uma migração com a finalidade de estabelecer-se no Egito. Este país, mais que um “dom do Nilo”, como dizia Heródoto, é o Nilo (http://www.bibleplaces.com/nileriver.htm). Ao longo de suas margens se estende uma faixa de uns 8 km de largura em que se desenvolve um intenso trabalho de cultivo.
            No sul, em direção à primeira catarata, a uns 800 km em linha reta e a uns 1000 km seguindo o curso do rio a partir do delta ( note-se que o rio Nilo flui para o norte), se achava Elefantina (http://pt.wikipedia.org/wiki/Elefantina http://www.ieab.es/elefantina.html), onde se instalou uma colônia judaica no século V a.C.. Os papiros arameus ali descobertos lançam muita luz sobre o período de Esdras e Neemias. Uns 160 km ao norte estava Tebas/Luxor/Karnak (http://es.wikipedia.org/wiki/Luxor http://es.wikipedia.org/wiki/Karnak), com seus magníficos templos, capital do Egito durante a famosa dinastia XVII (1570-1310), cujos reis expulsaram os hicsos e elevaram o Egito à categoria de grande império. A destruição deste império pelos assírios em 663 a.C. encheu de espanto os judeus (Na 3.8= Tebas em hebraico, e não Nô-Amom). Seguindo o curso do Nilo em direção ao norte, a uns 120 km de Tebas, onde o rio descreve uma curva, se acha Chenoboskion (perto de Nag’-Hammadi), onde se encontraram importantes documentos gnósticos coptas (http://pt.wikipedia.org/wiki/Nag_Hammadi). Aproximadamente uns 200 km mais ao norte, o Nilo passa junto a um lugar atualmente chamado de el-Amarna, a antiga Ajetatón, capital do faraó monoteísta Akhenatón=Amenófis IV (1370-1353), de cujos arquivos procedem as cartas de el-Amarna referindo-se aos habirus (http://pt.wikipedia.org/wiki/Cartas_de_el-amarna). Mais ao norte, na margem oposta do Nilo, se encontrava Oxyrhynchus, onde foram encontrados numerosos papiros da época do NT.
            No vértice do delta, onde o Nilo se divide em diferentes braços, se assentava Mênfis (Mof em Os 9.6; Nof em Is 19.13;Jr 2.16; Ez 30.13), a mais antiga capital do Egito (http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%AAnfis) . Perto dali, na direção norte, se achava Om/Heliópolis, pátria do sogro de José (Gn 41.45). Entre Mênfis e Heliópolis havia um grande cemitério, com suas imortais pirâmides e as esfinges (Cairo surge apenas após a invasão muçulmana, sobre um antigo forte romano chamado Babilônia, perto do local em que a lenda situa o término da viagem da Sagrada Família ao Egito – Mt 2.14). Em tempos de Alexandre Magno , no extremo noroeste do delta, se edificou a grande metrópole e porto marítimo de Alexandria (http://pt.wikipedia.org/wiki/Alexandria http://www.bibleplaces.com/alexandria.htm), onde se instalou uma forte comunidade judaica, que produziu a versão grega de alguns livros hebraicos (a Septuaginta). Apolo, que deu continuidade ao trabalho de Paulo em Corinto, é originário de Alexandria (At 18.24-28). Perto de Alexandria se descobriu, em tempos de Napoleão, a famosa Pedra de Roseta, que serviu para decifrar a linguagem egípcia (1799) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedra_de_Roseta).
            Para a história do êxodo, datado atualmente no século XIII, interessa sobretudo a porção nordeste do delta. Ramsés II (ca.1290-1224) da dinastia XIX, deixou vários monumentos  no vale do Nilo (http://pt.wikipedia.org/wiki/Rams%C3%A9s_II), sobretudo em Tânis (a Zoã de Is 19.11; Ez 30.14; Sl 78.12). É muito verossímil que esta cidade tivesse ocupado o lugar de Avaris, a antiga capital dos hicsos quatrocentos anos atrás. Nm 13.22 relaciona sua fundação com a de Hebrom e, por conseguinte, com os tempos dos patriarcas. Ramsés II ou seu pai Seti( 1304-1290) reedificou aquele lugar e lhe deu o nome de Ramessés (Ex 1.11). Foi nesta região de Tânis/Ramessés (cf. Gn 47.6,11; Sl 78.12,43) que os descendentes dos patriarcas sofreram a escravidão, obrigados a trabalhar nos projetos monumentais do faraó. A terra de Gósen (Gn 45.10;47.11) se estendia ao sul, abarcando Maskute (provavelmente, a Sucote de Ex 13.20) e Pitom (Ex 1.11). Segundo documentos egípcios, o wadi Tumilat, nesta região, era lugar freqüente de refúgio para os asiáticos que fugiam de fome ou de condições políticas desfavoráveis.
            A debatida questão da  rota do êxodo está intimamente relacionada com a localização do monte Sinai. SINAI E HOREBE não são montes distintos, e sim, nomes de um mesmo lugar que aparecem, respectivamente nas tradições J e E-D do Pentateuco. Há pelo menos quatro possibilidades para localizar esta santa montanha:
1) Ao sul da península do Sinai. O nome mesmo desta península pressupõe como correta a tradição segundo a qual o Gebel Musa (Monte Moisés), em cuja base se assenta o mosteiro de Santa Catarina, é o monte Sinai.
2) Na Arábia (cf. Gl 4.25): A fumaça e o tremor de terra de que se fala em Ex 19.18 sugerem que havia um vulcão em erupção, e o mais próximo é o Talt-Badr, na moderna Arábia, bem a sudeste da península do Sinai. Ptolomeu, o antigo geógrafo, chamava a esta região de Modiane, o que corresponde à Midiã de Ex 3.1. Apesar destes dois fatos independentes em favor de Talat-Badr, parece que a Arábia fica demasiadamente longe do Egito para ser o cenário do êxodo.
3) Na Transjordânia: O nome de Midiã se aplica a uma longa faixa de terra bem ao norte, até Galaade na Transjordânia (cf. Jz 6). Uma possível localização do Sinai seria, nestas paragens, Petra, já que as cores de fogo de suas rochas eram objeto de veneração desde muito tempo. Há, além disso, uma tradição árabe segundo a qual Aarão foi enterrado ali (Nm 20.28). Esta teoria, como a anterior, não conta com defensores na atualidade, porque neste caso o Sinai ficaria demasiadamente a leste.
4) No Negev: esta hipótese situa a teofania do Sinai em Cades-Barnéia. De fato, a água que brota da rocha e as murmurações do povo em Meribá durante a estada em Cades-Barnéia (Nm 20.13) são descritas em termos idênticos à narração do acontecido no Sinai segundo Ex 17.7. O argumento tem convencido apenas a um pequeno número de exegetas.
            Duas são as possíveis rotas do êxodo que merecem uma consideração atenta: a do norte, que corresponde quase sempre à localização do Sinai segundo a teoria 4, e a do sul, de acordo com a localização da teoria 1.
Em primeiro lugar, a teoria da rota norte sugere que os israelitas saíram de Tânis/Zoã diretamente para Cades-Barnéia, cruzando pela região norte da península do Sinai (http://www.cpad.com.br/fotos/escola/mapas/Exodo-3.jpg). Este seria o caminho mais curto e natural para ir do Egito à Palestina. Ela fica, sem dúvida, explicitamente excluída por Ex 13.17, embora se possa entender a referência aos filisteus como uma glosa anacrônica ( mesmo que os filisteus pirateassem pela costa palestina já no século XIII, não parece que tivessem tido um controle firme do sul de Canaã antes de 1180-1150, muito tempo depois do êxodo). Se quisermos harmonizar a descrição bíblica dos lugares percorridos durante o êxodo com a teoria da rota norte, temos que identificar o “mar dos Juncos” de Ex 13.18;14.22 (o texto hebraico diz “mar de Juncos”; o “mar Vermelho” de algumas traduções procede da LXX, que tentou identificar essa extensão de água com um lugar conhecido). Poderia ser a parte mais meridional do lago Mensale ou os vaus do lago Sirbone (perto do Mediterrâneo, entre o Egito e Canaã). O Migdol  de Ex 14.2 caía do lado egípcio do mar, e o texto hebraico de Ez 29.10 situa Migdol no extremo nordeste do Egito, muito longe de Assuã.  Cruzando os vaus desde Migdol estava Baal-Zefon (Ex 14.2), que significa “senhor do Norte”. O “norte”, a que faz referência este nome, não é um indício concludente, já que esta designação parece corresponder originariamente a uma elevada montanha da costa norte da Síria, o monte Cassio ou Amano. Um destacamento de soldados fenícios poderia ter levado consigo este nome da sua pátria para o Egito, aplicando-o em sentido irônico às colinas baixas situadas a oeste de Sirbone (ao nordeste do atual canal do Suez), chamada na época Pelusium e atualmente Farama.
            Outras informações bíblicas estariam mais de acordo com a rota sul, o que implicaria um desvio muito ao sul para alcançar o monte Sinai segundo a teoria 1 (http://www.cpad.com.br/fotos/escola/mapas/Exodo-3.jpg). (W.F. Albright trata de conciliar ambas as teorias, supondo que o êxodo seguiu uma rota norte, desviando-se logo para o sul; outros pesquisadores sustentam que houve vários êxodos, teoria que também se aplica à solução das discrepâncias cronológicas e arqueológicas que suscitam o êxodo e a conquista da Palestina). Seguindo um desvio para o sul, encontramos, na parte sul-central da Península do Sinai umas inscrições de ca. de 150 d.C. em um dialeto árabe chamado nabateu. Elas testemunham que o vale Mukkatab e o triângulo adjacente, que se estende uns 30 km para o Gebel Serbal e o Gebel Musa, eram objeto de veneração religiosa. O Serbal, 20 km a noroeste do Sinai, é um monte majestoso em forma de serra, que Jerônimo e alguns pesquisadores modernos têm por cenário da teofania sinaítica. Mas não há em suas imediações nenhum lugar apto para acampar, como parece exigir o relato bíblico. Junto ao “Sinai tradicional”, o Gebel Musa (http://www.bibleplaces.com/jebelmusa.htm), há um elevado precipício chamado Safsafa que domina a vasta planície de er-Raha. A proximidade da água e o esplendor de seus arredores têm convencido a maior parte dos exegetas modernos de que esta é a montanha de Ex 19.2. Sem dúvida, a tradição grega relacionada com o mosteiro de Santa Catarina desvia a atenção para o extremo oposto (leste) da cadeia formada pelo Gebel Musa. De qualquer forma, está claro que as provas aduzidas para esta localização não são muito firmes e não podem dar por finalizadas  a investigação sobre o assunto.
            Afirma-se que os israelitas , depois da teofania do Sinai, caminharam sob as ordens de Moisés durante quarenta anos em direção à Transjordânia. A rota do Sinai até Edom está assinalada duas vezes na Bíblia: a primeira, com muitas minúcias, em Nm 33, e a segunda, mais brevemente, em Dt 1. A lista de lugares não nos ajuda muito, pois na maior parte eles nos são desconhecidos. A Parã de Nm 12.16 e Dt 1.1 volta a aparecer como uma importante montanha em Dt 33.2 e Hc 3.3. Está fora de dúvidas que seu nome sobreviveu no do oásis de Feirã, perto do Gebel Serbal, mas a Bíblia supõe uma localização no deserto ao sul do mar Morto, chamado Arabá. A principal discrepância entre ambas as listas de lugares se refere a Eziom-Geber (que 1 Rs 9.26 situa junto a Elate, na margem do mar dos Juncos, no território de Edom) . De Dt 2.8 pode-se depreender que os israelitas chegaram a este porto somente depois de terem partido de Cades-Barnéia em direção à Arabá, que forma o costado ocidental de Edom. Mas Nm 33.36 situa claramente o acampamento em Eziom-Geber antes de Cades-Barnéia e Edom.
            Antes de passarmos a examinar em detalhes  a geografia da Transjordânia, convém mencionar, ainda que brevemente, o problema da continuação do êxodo para o monte Nebo, situado no extremo nordeste do mar Morto, onde Moisés morreu e foi sepultado (Dt 34.5). Havia três possíveis rotas para o norte partindo de Eziom-Geber, junto ao Golfo de Ácaba, em direção às montanhas da Transjordânia, ao leste do Mar Morto
 1) A rota mais ocidental ia diretamente para o norte através da depressão do Arabá, para dobrar ao sul do mar Morto e entrar nas terras altas, passando ao longo do limite entre Edom e Moabe.
2) A rota central e mais cômoda era a que seguia do golfo de Ácaba para a direção nordeste e através do wadi Yetem, desviando-se logo para o norte para alcançar a Estrada Real (Nm 20.17), que avançava ao longo da meseta montanhosa que formava o espinhaço de Edom e Moabe.
3) A rota mais oriental ou caminho do deserto, ao qual se chegava também pelo wadi Yetem, mas dobrando logo para o leste e adentrando no deserto antes de dobrar de novo para o norte rodeando Edom e Moabe pelo leste.
            A passagem pela rota 2, a mais cômoda, foi trancada pelo rei edomita (Nm 20.14-21). Segundo a tradição P, parece que Israel seguiu a rota 1, pois em Nm 33.42 encontramos os israelitas atravessando para o norte pelo Arabá, em direção a Punom, onde parece situar-se o episódio da serpente de bronze (Nm 21.4). Segundo Nm 21.10-13, parece que dobraram logo para o leste, passaram através do vale de Zerede, saindo logo para o deserto depois de seguir a linha divisória entre Edom e Moabe. Sem dúvida, Dt 2.8 indica que Israel não utilizou a rota do Arabá, e sim a rota 3. Está fadado ao fracasso o intento de seguir uma das rotas? Ou será que houve várias rotas seguidas por grupos distintos, analogamente às diferentes rotas do êxodo? Em qualquer caso, o certo é que os israelitas chegaram à terra prometida após  peregrinar  vários séculos,  que os levou de um extremo a outro do Crescente Fértil, para então voltar, em parte, um trecho do caminho percorrido.

III – GEOGRAFIA DA PALESTINA

            3.1 – CONFIGURAÇÃO E CARACTERÍSTICAS

            A região que vamos descrever agora é uma estreita faixa de terra que mede entre 320 e 380  km de Dã, no norte,  até o limite com península do Sinai, ao sul (de Dã a Cades-Barnéia= 320 km; de Dã a Eilat=380 km). Está incluída nestas dimensões a vasta extensão do deserto do Negev, um território que teve grande importância na história israelita, mas que não pode ser considerado propriamente como pertencente àquela nação. Se ficarmos com a expressão bíblica clássica “de Dã até Berseba”(1 Sm 3.20; 2 Sm 3.20; 17.11; 24.2,15;1 Rs 5.5; Jz 20.1; 1 Cr 21.2; 2 Cr 30.5), a longitude máxima do país israelita seria de apenas 240 km. A largura da costa mediterrânea até a depressão do Jordão varia entre uns 50 km ao norte e uns 80 km na altura do mar Morto. Estritamente falando, os 30 km de meseta montanhosa que se estendem pela Transjordânia, a leste do rio Jordão, não se deveria considerar como território israelita. Israel, por conseguinte, abarcaria uns 23.000 km quadrados, equivalente a Sergipe, o menor Estado brasileiro. A história bíblica desenvolveu-se num cenário muito pequeno. As capitais da monarquia dividida, Samaria ao norte e Jerusalém ao sul, distavam uns 55 km entre si.
            Teremos que ocupar-nos também com o Negev e a Transjordânia junto com o Israel propriamente dito. Esta área mais ampla se presta a uma divisão em quatro faixas quase paralelas no sentido norte-sul (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/TS/indexEs.html). Enumeradas do leste para o oeste, são elas: 1) As montanhas da Transjordânia; 2) A depressão do vale do rio Jordão; 3) As montanhas da Palestina ou Cisjordânia; 4) A planície costeira do Mediterrâneo (http://www.cpad.com.br/fotos/escola/mapas/Relevo-Palestina.jpg ).
Originalmente ambas as cadeias de montanhas (1 e 3) formavam uma só. Separaram-se em conseqüência de um afundamento da crosta terrestre na direção norte-sul. Esta falha tectônica é conhecida como Rift Valley. Ela faz parte de um sistema que afunda a crosta terrestre desde a costa sudeste da África, passando pela região dos grandes lagos (Niassa, Tanganica e Vitória), continua pelo Mar Vermelho e pelo golfo de Ácaba, continua em linha reta pelo norte, atravessando a Palestina, o Líbano e a Síria até penetrar na meseta da Anatólia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Vale_do_Rift).
 Em todo o percurso asiático, o vale formado por essa falha geológica é cercado por cadeias de montanhas: Na Síria, o VALE DE GHAB é ladeado pelas cordilheiras do Anshariyeh (perto da costa mediterrânea) e do Jebel Zawiyeh (voltado para o Grande Deserto. No Líbano, o VALE DE BEQAA é cercado pelas cordilheiras do Líbano (junto ao mar) e do Antilíbano(em direção ao deserto). Ao pé dessas  duas cordilheiras, cujas alturas máximas são 3000 m. acima do nível do mar, nascem os rios que se alimentam das águas e neves das montanhas: o rio Litani, cujas águas descem para o sul para depois dobrar para o oeste e desembocar no Mediterrâneo ao norte de Tiro. O rio Orontes se dirige para o norte, atravessando os vales de Beqaa e Ghab, desembocando no Mediterrâneo perto  da cidade turca de Antioquia. As duas cadeias de montanhas que constituem as faixas 1 e 3, na Transjordânia e na Palestina, são, respectivamente, o prolongamento das montanhas do Antilíbano e do Líbano, na Síria.
Na Palestina, o afundamento da faixa 2 formou a depressão do Jordão (Ghor, em árabe), pela qual fluem agora as águas do rio Jordão, desde as montanhas do Líbano até o mar Morto, no sul.
É possível que algumas montanhas da Palestina tenham tido alguma vez uma atividade vulcânica. A leste da Palestina, o Gebel Druze apresenta algumas mostras vulcânicas em forma de lava ou basalto espalhados sobre Basã e sobre a parte leste do deserto da Transjordânia. Em Callirhoe, junto à margem oriental do Mar Morto, há mananciais térmicos que demonstram a existência de certa atividade ígnea no subsolo. Há provas claras de que na antiguidade houve vários terremotos (Am 1.1). A arqueologia demonstrou que o mosteiro de Qumrã, dos essênios, foi destruído por um terremoto (por volta de 31 a.C.), tendo sido reconstruído durante o governo de Arquelau, no início da era cristã. Também em época recente houve vários terremotos (Safed em 1837; Nazaré em 1900, Jafa em 1903; Jericó em 1927).

3.2 – CLIMA

O clima varia segundo as características de cada região: a costa, as montanhas, a depressão do Jordão. Fundamentalmente o ano se divide em duas estações: o verão, quente e seco, e o inverno, frio e úmido. A costa da Palestina é quente (de 10 a 15 graus no inverno e de 27 a 32 graus no verão). Nas montanhas, a temperatura é uns 5 graus mais baixa que na costa, com grandes diferenças entre o dia e a noite. No verão, nas montanhas (Jerusalém, por exemplo) as temperaturas são de 30 graus durante o dia e de 18 graus durante a noite. Nas montanhas, o mau tempo não se deve à umidade, como ocorre na costa, e sim, aos fortes ventos: o vento que arrasta as chuvas procede do Mediterrâneo, e o vento abrasador (siroco ou khamsin), vem do deserto nos meses de maio e outubro (Is 27.8; Jr 4.11). Jesus conhecia a ambos (Lc 12.54-55), e durante o inverno passava pelo único pórtico do templo que oferecia uma proteção (Jo 10.22-23). A depressão do Jordão, que está muito abaixo do nível do mar (Jericó, por exemplo), se vê submetida a um intenso calor durante o verão (uns 40 graus), mas no inverno possui uma estação muito agradável.
Também as chuvas variam na Palestina segundo a região (http://www.cpad.com.br/fotos/escola/mapas/Relevo-Palestina.jpg). Quanto mais próximas do Mediterrâneo, mais chuvas as terras recebem, pois as montanhas atuam como uma barreira que detém os ventos úmidos do mar e as faz descarregar sobre as ladeiras ocidentais. As ladeiras voltadas para o oriente, portanto, são mais secas. Berseba, no Negev, registra uma média de 143 mm. cúbicos de chuva por ano, Jerusalém alcança 583, mas quase toda esta quantidade de chuva cai entre dezembro e março. Ano promissor é aquele em que as chuvas precoces ou de outono começam a cair em outubro, no tempo da semeadura, e a chuva tardia ou de primavera, em março ou abril, pouco antes da colheita. São numerosas as alusões bíblicas a estes dois tipos de chuvas: Dt 11.14; Os 6.3; Jr 5.24; Jl 2.23. Há que se ter em conta que as chuvas não se concentram exatamente nos dois períodos mencionados, e sim, tendem a distribuir-se no período intermediário. Os meses de verão, de junho a setembro, costumam ser extremamente secos, exceção feita a uma ou outra tormenta na costa. As chuvas não possuem nada de extraordinário para os ocidentais, mas para os israelitas recém chegados do Egito ela devia causar uma grande impressão, pois lá as águas vêm do Nilo, e não do céu (Dt 11.10-25). A neve não é desconhecida nas montanhas da Palestina, por exemplo, em Belém, Jerusalém ou Hebrom (http://www.bibleplaces.com/jerusalemsnow.htm). Na Transjordânia, as nevascas às vezes chegam a bloquear as estradas.
O caráter sazonal das chuvas significa que é preciso guardar água em cisternas (Gn 37.22; Pv 5.15; Jr 38.6), com vistas à estação seca, a menos que uma cidade seja tão afortunada que conte com um manancial nas imediações, como a fonte Gihon em Jerusalém, para dispor de “água viva” (daqui as imagens de Ez 47.1; Zc 13.1; Jo 4.10-14). Um acidente característico da Palestina é o wadi, leitos temporários de água, secos no verão, e que transportam torrentes de água durante as chuvas de inverno. Quando estão secos, estes wadis servem de caminhos para subir dos vales para as montanhas. São muito escassos os vales que contam com um curso permanente de água.
Ocupemo-nos agora com as quatro faixas de terra no sentido norte-sul. Vamos começar com a região montanhosa da Transjordânia, descrevendo-a de sul a norte, de acordo com a etapa final do êxodo, que proporcionou a Israel o primeiro contato com esta região.

3.3 – AS QUATRO FAIXAS PARALELAS NO SENTIDO NORTE-SUL

3.3.1 – A TRANSJORDÂNIA

As montanhas da Transjordânia são mais elevadas que as da Palestina. Estão cortadas de leste a oeste por tremendas gargantas ou cânions, que conduzem ribeiros permanentes de água. Enumerados do sul para o norte, são eles: o Zerede (Nm 21.12; Dt 2.13), que desemboca no extremo sul do Mar Morto; o Arnom (Nm 21.13; Dt 3.16), que desemboca na metade do mar Morto, 12 km ao sul da fortaleza herodiana de Maquerus e que formava a fronteira sul da Peréia no período do NT; o Jaboque (Gn 32.22), que desemboca no rio Jordão, na metade do vale de mesmo nome (http://www.bibleplaces.com/jabbok.htm); e o Jarmuque, que desemboca 6 km ao sul do mar da Galiléia. Estas gargantas serviam muitas vezes de fronteiras naturais às antigas populações da Transjordânia.
As montanhas do sul da Transjordânia, que constituem os antigos domínios de Edom, começam a uns 30 km a nordeste de Eilat, no golfo de Ácaba. A rota vai seguindo o wadi Yetem, que forma uma passagem através das montanhas graníticas de Midiã. Logo cruza o Hasma para as montanhas de EDOM. É um lugar fantástico, mais próprio da superfície lunar que da terrestre: uma grande planura de areia da qual se destacam, isolados, picos de rochas arenosas, cortadas por precipícios enorme (http://www.bibleplaces.com/edom.htm). A região mais famosa do Hasma é o wadi Rum, a região em que se movia Lawrence da Arábia, no qual os picos se elevam bruscamente a 800 metros sobre o nível do vale(http://www.bibleplaces.com/wadirum.htm).
A meseta montanhosa de EDOM se leva a mais de 1600 metros, com um comprimento de uns 110 km de norte a sul e uma largura de cerca de 25 km. No oeste, as montanhas estão cobertas por uma vegetação raquítica, alimentada pelas últimas gotas de chuva que as nuvens provenientes do Mediterrâneo deixam cair. Nesta parte, a inclinação forte em direção ao vale do Arabá (o prolongamento da depressão do Jordão ao sul do mar Morto) oferecia uma defesa natural. Para o leste, as montanhas baixam suavemente para o deserto, e este lado tinha que ser protegido por fortificações. Ao menos durante parte de sua história o limite norte de Edom foi o Zerede ou o arroio dos salgueiros (Is 15.7), tendo em frente a Moabe (Nm 21.12; Dt 2.13). Grande parte destas mesetas de Edom estão formadas por rochas arenosas, facilmente atacáveis pela erosão. No sul de Edom,  Petra, a cidade de cor rosa escavada nas rochas arenosas e antiga capital dos árabes nabateus merece ser citada como uma das maravilhas do mundo (http://www.bibleplaces.com/petra.htm).
A meseta de Edom pode ser dividida em duas partes desiguais pela baixada de PUNOM, 40 km a sudeste do mar Morto, pela qual o vale do Arabá  adentra uns 15 km nas montanhas até formar uma passagem muito estreita. A região situada ao sul de Punom é mais elevada, e nela estavam situadas as fortalezas edomitas de Temã (Jr 49.7) e Selá, praticamente inexpugnáveis ( discute-se acerca da localização de Selá; há que pôr em dúvida a tradição popular que a identifica com Umm el-Biyara, no centro de Petra). Ao norte de Edom, as cidades principais eram Bozra (Gn 36.33; Mq 2.12) e o rico centro agrícola de Tofel (Dt 1.1). A Bíblia une seguidamente as cidades de Bozra, no norte e Temã, no sul, para designar a totalidade de Edom (Gn 36.33-34; Jr 49.20-22; Am 1.12).
Os montanheses da meseta edomita, que moravam “nas tendas das rochas”(Ob 3) não podiam manter-se só à base da agricultura e da criação de gado. Extraíam cobre de suas montanhas e exigiam taxas das caravanas que seguiam pela estrada real em direção ao norte, atravessando sua meseta (http://www.bibleplaces.com/punon.htm). Este contato permanente com estrangeiros pode ter contribuído para dar-lhes a fama de sábios ( Jr 49.7).
O território de MOABE, em sentido estrito, perece que se estendeu entre os ribeiros Zerede e Arnom (Dt 2.24;Nm 22.36), a leste, portanto, da metade sul do mar Morto. Porém Moabe muitas vezes estendeu suas fronteiras para além do rio Arnom, de modo que, como no caso de Edom, se pode falar de uma Moabe do Norte e de uma Moabe do Sul, com o Arnom como o limite entre ambas (Jr 48.20 implica que o Arnom era o traço geológico mais característico de Moabe) (http://www.bibleplaces.com/moab.htm). No sul, a cidade mais importante era Quir-Heres (2 Rs 3.25; Is 16.11), a moderna Kerak, impressionante fortaleza natural situada sobre uma colina isolada. Atualmente ela está coroada por um castelo dos cruzados, testemunho mudo de que desde os tempos bíblicos até a primeira guerra mundial esta foi uma das mais importantes praças fortes de toda a Palestina. Em 2 Rs vemos como esta fortaleza moabita fez frente às forças reunidas de Israel e Judá.
Na parte norte de Moabe, Aroer (Dt 2.36) dominava pelo lado norte a grande garganta do Arnom, com desníveis de mais de 700 metros de profundidade. Oito km mais ao norte se encontra Dibom (Nm 21.30), a atual Dhiban, cidade importante cujos muros foram recentemente escavados. Mais ao norte, numa rica planície, estava Madeba (Is 15.2), famosa por causa do mapa em mosaico nela encontrado em fins do século XIX. (http://www.bibleplaces.com/madabamap.htm). Mesa, rei de Moabe, se gloria de havê-la reconquistado de mãos israelitas, na estela que erigiu em Dibom para comemorar suas vitórias (a “pedra de Moabe”, uma pedra de basalto negro de ca. 830 a. C., encontrada em 1868 nas ruínas de Dibom) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedra_Moabita). Ao norte, a passagem para Moabe estava protegida pela fortaleza de Hesbom ( Is 15.4;16.8-9).
Uns 8 km a oeste de Madeba e Hesbom, dominando o mar Morto, estava o lugar de onde Moisés contemplou panoramicamente a terra prometida e onde também morreu, chamado de monte Nebo na tradição P (Dt 32.49) e Pisga na E (Dt 34.1) (http://www.davidguerrero.com/viajes/orientemedio2003/montenebo/index.html http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/04bGiordEs.html#Nebo). Possivelmente se trata de dois promontórios de uma mesma montanha. Nos tempos do NT, a sudoeste do Nebo e perto do mar Morto, estava a fortaleza de Maqueronte, um pico isolado que Herodes Magno converteu em fortaleza inexpugnável. Segundo o historiador judeu Flávio Josefo (Ant.18.5,2) ali João Batista encontrou a sua morte (Mc 6.14-29) (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/05GiordEs.html). Nas fontes termais situadas nas proximidades, em Callirhoe, Herodes buscou alívio para a sua enfermidade (http://www.bibleplaces.com/callirhoe.htm).
Como dissemos, a ocupação dos territórios situados ao norte do rio Arnom pelos moabitas nem sempre foi reconhecida por outras populações. Assim, por exemplo, quando Moisés conduziu a Israel através da Transjordânia, os amorreus haviam ocupado Hesbom e os territórios mais ao sul, até o rio Arnom, incendiando Madeba e saqueando Dibom (Nm 21.26-30). Em seguida, parte dos territórios moabitas do norte foram ocupados pela tribo de Rúben (Nm 32.37; Js 13.9), mas esta tribo foi rapidamente destruída por uma agressiva expansão de Moabe, que chegou inclusive a Jericó, atravessando o Jordão (Jz 3.12ss;Gn 493-4). Há que notar-se que as planícies de Moabe, onde os israelitas acamparam antes de cruzar para Jericó, não estava situada na meseta moabita, e sim, no vale do Jordão,  no nordeste do mar Morto.
O território da meseta moabita é muito diferente dos difíceis promontórios meridionais de Edom. Mesmo que certos cultivos, como o trigo ou a cevada, só sejam possíveis em uma zona muito reduzida, principalmente na parte norte do território, a meseta oferece boas pastagens. Inclusive em nossos dias, as negras tendas dos beduínos marcam o país, assinalando os lugares em que apascentam seus rebanhos. Economicamente são descendentes de Nessa, rei de Moabe, que “era pastor de ovelhas e tinha que entregar todos os anos ao rei de Israel cem mil cordeiros e a lã de cem mil carneiros” (2 Rs 3.4). Quando  Rúben ocupou o território moabita, teve tanto trabalho com o gado, que não pode prestar ajuda a seus parentes das outras tribos em tempos de guerra (Jz 5.16). A riqueza de Moabe talvez explique o orgulho de que Jr 49.26 e Is 25.10-11 acusam a seus habitantes. Gn 19.37 faz os moabitas descender da união incestuosa de Ló com sua filha primogênita. Rute, bisavó de Davi e da linhagem de Jesus, era moabita (Rt  4.5,17; Mt 1.5).
Ao norte de Madeba e Hesbom se estende a longa faixa de terra de Gileade, paralela a grande parte da depressão do rio Jordão, entre o mar Morto e o lago da Galiléia. Antes de estudarmos esta região, demos uma olhada em AMOM, território situado a leste de Gileade e a nordeste de Moabe do norte. Ali os amonitas se estabeleceram numa zona mal definida de terra que ia desde o rio Jaboque, no norte, até, em ocasiões, o Arnom, no sul, quando Moisés introduzia os israelitas na Transjordânia (Jz 11.13). Amom parece o mais débil dos reinos que temos estudado. Para se ter uma idéia da situação flutuante da fronteira, basta notar que, ao atacar o reino amorreu de Hesbom (que depois passaria a ser território de Rúbem), Israel não pensava atacar nem a Moabe nem a Amom, se bem que ambos os povos reivindicassem aquele território. Note-se que Js 13.25 caracteriza o território de Gade, sul de Gileade, como país amonita.
Se as fronteiras de Amom estavam confusas, sua capital era indiscutivelmente Rabat-Amom (em tempos do helenismo, Filadélfia da Decápolis, atualmente Amã, capital da Jordânia). (http://www.bibleplaces.com/amman.htm). A formidável cidadela montanhosa desta localidade ofereceu enérgica resistência ao exército de Davi (2 Sm 11.14-21; cf. Am1.14). Em tempos posteriores, ca. de 400 a.C., Tobias, o amonita, grande inimigo de Neemias ( Ne 4.1;6.1-17;13.4), parece ter  estabelecido seu quartel general numa fortaleza chamada agora Araq el-Emir, que foi recentemente escavada.
O país de Amom, encerrado entre as montanhas do sul de Gileade e o grande deserto, era um planalto. Seu território mais fértil era o vale do rio Jaboque superior, rio que nasce perto de Rabat-Amom e avança para o norte antes de dobrar para o oeste em direção ao vale do Jordão (http://www.bibleplaces.com/jabbok.htm). Os amonitas, que haviam se apossado por força desta região, se viam obrigados a defendê-la constantemente de saqueadores procedentes do deserto (o mal que ameaça os amonitas em Ez 25.4-5). Se bem que nunca foram muito fortes, os amonitas puderam organizar às vezes rápidos ataques contra tribos israelitas (Jz 10.9; 1 Sm 11.1; Am 1.13; 2 Rs 24.2; Jr 40.14). Quando tinham que enfrentar um Israel unido, precisavam de ajuda alheia (2 Sm 10.6). Amom estava submetida a Israel durante longos períodos (2Sm 12.31; 2 Cr 27.5). Segundo 1 Rs 11.7, sua religião exigia sacrifícios humanos ao deus Moloque.
Quanto à GILEADE, o rio Jaboque, em sua descida desde as montanhas da Transjordânia para o vale do Jordão, divide este território em duas partes. A parte do sul, conquistada do rei amorreu de Hesbom (Dt 2.36; Js 12.2) foi concedida à tribo de Gade. A parte norte, tomada do rei de Basã (Dt 3.10;Js 12.5) foi concedida a uma parte da tribo de Manassés( cf. Dt 3.12-13; Js 13.25,31, se bem que o limite entre as tribos, assim como aparece na Bíblia, apresenta muitas vezes uma evolução histórica mais complicada do que supõem os relatos).
Gileade tem uma configuração oval, de uns 55-65 km no sentido norte-sul e 40 km no sentido leste-oeste. A meseta montanhosa tem aqui uma forma de cúpula , chegando a elevar-se a 1.100 metros. Devido à sua altitude, recebia chuvas abundantes graças às nuvens que, procedentes do Mediterrâneo, chegavam até aqui no inverno. As colinas de pedra armazenam água e isso dá origem a abundantes mananciais. Antigamente, Gileade, especialmente o norte deste território, estava coberto de abundantes bosques (Jr 22.6; Zc 10.10). Era famoso o bálsamo que se obtinha das árvores de Gileade (Jr 8.22;46.11), que se exportava para a Fenícia (Ez 27.17) e para o Egito (Gn 37.25). Também abundavam os vinhedos neste região. Extraia-se minerais de sua montanhas e os bosques proporcionavam abundante combustível para suas fundições.
O país era exposto a contínuos ataques dos amonitas pelo sul e dos arameos pelo norte. Da campanha de Gideão, temos notícias de cidades importantes de Gileade, como Sucote e Penuel, ambas situadas nas imediações do Jaboque. Sucote poderia ser  Tell Deir-Alla, um enorme montículo situado na conjunção dos vales do Jaboque e do Jordão. Escavações recentes sugerem que houve uma conquista israelita por volta de 1200 e uma ocupação filistéia posterior. Até agora não se tem provas de que os filisteus chegaram a controlar tão grande extensão no vale do Jordão. Penuel, muitos quilômetros a leste do vale do Jaboque, é o lugar da luta sustentada por Jacó com um anjo (Gn 32.30-31). Ao que parece, serviu de capital ao reino norte nos tempos de Jeroboão I (ca.915; 1 Rs 12.25). Maanaim, outro importante centro de Gileade (Gn 32.2), ao sul do Jaboque, foi a “capital do exílio” de Is-Bosete, filho de Saul (2 Sm 2.8). Uma das razões para se estabelecer estas capitais provisórias em Gileade era que a configuração do terreno dava vantagens ao movimento de pequenas tropas em relação a exércitos maiores, de tal modo que este país converteu-se num lugar de refúgio, por exemplo, para Davi, quando fugia de Absalaão (2 Sm 17.24) (http://www.bibleplaces.com/gileadlower.htm).
Jabes-Gileade, importante cidade situada ao norte do território, mantinha, ao que parece, estreitas relações com Benjamim, instalado na outra margem do Jordão (Jz 21.5-12; 1 Sm 11) (http://www.bibleplaces.com/gileadlower.htm). Ramote-Gileade, a leste, cidade levítica de refúgio (Dt 4.43), desempenhou importante papel nas guerras do século IX entre Israel e os arameus da Síria (1 Rs 22; 2 Rs 8.28). Nos tempos do NT, Gerasa (Mc 5.1-20) (http://www.bibleplaces.com/gerasa.htm)(http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/01GiordEs.html#Jerash), uns 8 km ao norte do Jaboque, e Gadara (Mt 8.28-34) (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/02GiordEs.html#Gadara), no extremo noroeste de Gileade, com uma vista impressionante sobre o rio Jarmuque, eram importantes cidades da Decápolis. Pela (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/01GiordEs.html#Pella), no vale do Jordão e ao pé das montanhas do norte de Glieade, era outra cidade da Decápolis, que, segundo Eusébio de Cesaréia, serviu de refúgio aos cristãos palestinenses no tempo da guerra judaica contra os romanos (66-70 d.C.).
Poucos quilômetros ao sul do Jarmuque, as montanhas de Gileade descem suavemente e formam uma meseta muito fértil. São os campos de BASÃ, conhecidos atualmente como as colinas de Golam (http://www.bibleplaces.com/golanheights.htm). Eles iniciam às margens do rio Jarmuque, seguem paralelos ao lago de Genezaré,  alcançam o pé do monte Hermom no norte, e a leste vão até as negras montanhas vulcânicas do Gebel Druze.Aqui as chuvas são suficientes, pois as colinas baixas da Galiléia não chegam a impedir  a passagem das nuvens procedentes do Mediterrâneo, que podem regar os campos de Basã.         Em muitas partes desta região, o solo é formado por ricos depósitos vulcânicos. Ao juntar-se a água das chuvas e a fertilidade do solo, Basã se converte em região produtora de grãos, que abastece de trigo a esta região, além de possuir boas pastagens para o gado. A gordura dos animais de Basã tornou-se proverbial na Bíblia (Sl 22.12; Am 4.1; Ez 39.18). Para o leste, nas ladeiras do Gebel Druze, cresciam robustos carvalhos, de modo que Basã era comparada com o Líbano pelo esplendor de suas árvores (Is 2.13; Na 1.4; Ez 27.6;Zc11.1-2). Os bosques de Basã serviam muitas vezes de refúgio a quem se encontrava em apuros (Sl 68.15,22; Jr 22.20).
São escassas as referências bíblicas a lugares concretos de Basã, pois Israel só controlou este território em momentos de maior esplendor. Uma das cidades de Ogue, rei de Basã, era Salcá (Dt 3.10, a moderna Salkhad), no Gebel Druze, e Edrei ( a moderna Der’a), situada mais a oeste, onde teve lugar a vitória de Moisés sobre Ogue (Nm 21.33-35). Nos tempos de Davi, o reino arameu de Gesur se estendeu até ocupar a porção de Basã, perto do lago da Galiléia. Este reino foi submetido por Davi, e dali procedia a princesa que foi mãe de Absalão ( 2 Sm 3.3;13.37-38). No século IX, Basã foi cenário de lutas entre Israel e os sírios de Damasco (2 Rs 10.32-33). Nos tempos dos macabeus, houve lutas neste território, quando Judas acudiu os judeus estabelecidos em Bosor, Bosra e  Carnain ( 1 Mac 5.24-52).
Na época do NT, várias cidades que integravam a DECÁPOLIS (Hipos, Diom, Rafana) estavam situadas em Basã. GAULANITES (ao norte de Basã) e TRACONITES (a leste) formavam parte da Tetrarquia de Filipe (Lc 3.1). Atualmente, as ruínas das cidades, edificadas com pedras basálticas (Umm el-Jimmal) se elevam como negros monumentos à glória do passado (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/02GiordEs.html#Umaljimal).

3.3.2 A DEPRESSÃO DO JORDÃO

A segunda faixa que caracteriza as terras bíblicas em sentido norte-sul é a depressão do rio Jordão. Vamos acompanhá-la a partir do norte. No moderno Líbano, as cadeias de montanhas do Líbano e do Antilíbano, que se estendem na direção norte sul, se encontram separadas pelo fértil vale de BEQAA, formado pela falha que separou as duas montanhas, e que na atualidade é um vale elevado que alcança de 500 a 1000 metros de altitude. Em meio a este majestoso vale estão as ruínas da cidade helenística de Baalbeq, um dos atrativos turísticos do Oriente Próximo. Hoje, tal como nos tempos antigos, a fronteira norte de Israel coincide com o impressionante local em que o vale de Beqaa dá lugar à grande depressão do Jordão, em uma abrupta queda de 400 metros até a depressão do lago de Hule. Antigamente, este território no extremo norte de Israel pertencia à tribo de Dã, de onde a expressão “de Dã até Berseba” servia para assinalar os limites da nação israelita. Dominando a cena se eleva o monte Hermom, coberto de neve, e que forma o extremo sul do Antilíbano, com seus 2750 metros de altitude (http://www.bibleplaces.com/mthermon.htm). Os árabes chamam este pico de “el Sheik”, pois suas neves perpétuas se assemelham a um albornoz branco de um notável. Na antiguidade era chamado de Siriom pelos fenícios e Senir pelos amorreus (Dt 3.9). Israel o compara a uma sentinela que monta guarda sobre sua fronteira norte (Dt 4.48; Ct 4.8).

3.3.2.1- As fontes do Jordão e o vale do Hule

O rio Jordão nasce à sombra do monte Hermom, de quatro correntes alimentadas por águas recolhidas nas montanhas do Líbano. Duas destas correntes, o Bareighit e o Hasbani, descem do vale de Beqaa, formando cascatas. No Sl 42.6-7 se canta a beleza desta região, com seus saltos de água e seus turbulentos arroios na primavera.  Os dois afluentes mais caudalosos, o Liddani e o Banyasi, brotam ao pé do Hermom, perto da cidade de ( a moderna Tell el-Qadi)( http://www.bibleplaces.com/dan.htm) e Cesaréia de Filipe (Banias) (http://www.bibleplaces.com/banias.htm). Jz 18 nos informa que Dã se adonou desta região de bosques e mananciais quando a tribo avançou para o norte da Palestina central.  A cidade de Laís (leão em hebraico), mencionada neste relato, talvez seja uma reminiscência da abundância de feras naquela região (Dt 33.22). O santuário de Dã, importante centro de culto da época dos juízes ( Jz 18.30; Am 8.14), foi um dos santuários oficiais do reino do norte (1 Rs 12.29; 2 Rs 10.29). Abel-Bete-Maaca, localizada no extremo norte de Dã, foi o lugar em que se encontraram os elementos revolucionários opostos ao reino do sul (2 Sm 20.14-22). A ressonância religiosa de Dã se prolonga até os tempos do NT, pois Pânias (a moderna Baniyas) era um centro de culto ao deus Pan. A cidade foi reconstruída com o nome de Cesaréia de Filipe, onde Pedro reconheceu a Jesus como o Messias (Mc 8.27). Alguns têm sugerido que o monte Hermom, que domina Cesaréia de Filipe, seja a “montanha alta” da transfiguração que se narra logo a seguir (Mc 9.2), embora o local tradicional seja considerado o monte Tabor.
Na antiguidade, a DEPRESSÃO DE HULE, de uns 15 km de comprimento e uns 5 de largura, recolhia estes quatro afluentes, junto com alguns outros de menor importância, formando um terreno encharcado e um lago pouco profundo de uns 4 km de comprimento. Hoje toda a área está drenada como medida de combate à malária. As águas que afluíam para o lago saiam juntas pelo leito do rio Jordão.
A depressão do Hule, na direção norte-sul, era lugar de passagem entre a Palestina e o vale de Beqaa. No sul do lago atravessava um caminho no sentido oeste-leste, que unia a Palestina a Damasco (Síria). Para dominar esta passagem estratégica estava construída ali a fortaleza de Hazor (http://www.bibleplaces.com/hazor.htm). Assentava-se sobre as montanhas próximas ao Hule, na parte sudoeste, e era a principal cidade do norte da Palestina. Após dominar o centro e o sul do país, Josué dirigiu-se para Hazor, por ser esta cidade a chave natural para conquistar o norte (Js 11).
Nos 15 km que separam o lago de Hule do lago da Galiléia, o rio Jordão (cujo nome significa o que desce com força) flui por uma estreita garganta basáltica cujas paredes se elevam a mais de 350 metros sobre o nível da corrente. O ímpeto das águas se explica pelo fato de que, à saída do Hule, elas estão a 2 metros acima do nível do Mediterrâneo, chegando a 205 metros abaixo quando desembocam no  lago da Galiléia. Sobre a meseta ocidental, na região em que o rio Jordão se aproxima da sua desembocadura no lago da Galiléia, estão as obscuras ruínas de Corazim, a cidade que Jesus maldisse por não saber apreciar seus milagres (Mt 11.2) (http://www.bibleplaces.com/chorazin.htm).

3.3.2.2 O LAGO DA GALILÉIA

Entramos agora na principal região em que Jesus desenvolveu seu ministério, e certamente uma das mais formosas da Palestina. O LAGO DA GALILÉIA tem a forma de um coração, com 20/21 km de comprimento por 11/13 de largura. Sua profundidade chega a 50 metros. Em hebraico leva o nome de Quinerete (=harpa: Nm 31.11, de onde vem o nome da planície de Genesaré em Mt 14.34), e  lago de Genesaré em Lc 5.1 ou lago de Genesar em Josefo. Marcos e Mateus dão a esta massa de água o nome de mar da Galiléia, mas Lucas o designa, mais corretamente, de lago.  Só João o chama de lago de Tiberíades ( 6.1;21.1), nome que recebeu mais tarde, no século I d.C., depois que Herodes Antipas construiu uma cidade com o mesmo nome em sua margem sudoeste, em servil homenagem ao imperador romano Tibério e na qual Jesus nunca esteve (http://www.bibleplaces.com/seagalilee.htm).
As águas azuis do lago estão rodeadas por descidas abruptas em todas as partes, menos na margem norte. A beleza da região desde sempre atraiu o ser humano. As cavernas das colinas situadas a noroeste deram a conhecer algumas das marcas mais antigas do ser humano pré-histórico da Palestina. Na atualidade, os turistas ou peregrinos encontram nesta região o local mais adequado para meditar, como o próprio Jesus (Mc 1.35;6.46). Porém nem sempre houve paz nestes lugares. Nos “Cornos de Hatim”, abrupto acesso da baixa Galiléia para o lago (por onde Jesus teve de passar quando foi de Nazaré para Cafarnaum – Lc 4.31; Jô 2.12), teve lugar a batalha decisiva em que Saladino retirou definitivamente dos cruzados o poderio sobre a Palestina.
Os discípulos de Jesus eram pescadores neste lago. Mais de uma vez ele experimentou as tormentas repentinas quando atravessava o lago num barco. Os invernos moderados deste lago resguardado ofereciam um bom refúgio àquele pregador ambulante que muitas vezes não tinha onde reclinar a cabeça (Mt 8.20). Com freqüência, seu auditório se recrutava dentre os habitantes das cidades comerciais da margem norte, dentre os mercadores que percorriam o caminho para a Síria pela margem ocidental do lago ou dentre a multidão de funcionários que controlavam a passagem do Jordão, limite entre a Galiléia de Herodes Antipas e a tetrarquia de Filipe em Basã. Cafarnaum, situada na margem noroeste e terra natal de Pedro (Mc 1.21,29) foi eleita por Jesus como centro de suas atividades. Sua sinagoga o ouviu falar mais de uma vez (Lc 4.31;7.5; Jo 6.59) (http://www.bibleplaces.com/capernaum.htm). Nas cercanias se procura localizar, atualmente, o monte das bem-aventuranças (http://www.bibleplaces.com/mtbeatitudes.htm), e Tabga, local que guarda a memória da bênção sobre os pães e peixes (http://www.bibleplaces.com/tabgha.htm). A uns 6 km de Cafarnaum, cruzando o Jordão, estava Betsaida, cidade que guarda alguma relação com o milagre dos pães (Lc 9.10; Jo 6.1). Dali eram, segundo Jo 1.44 e 12.21, Pedro, André e Filipe (http://www.bibleplaces.com/bethsaida.htm). Maria Madalena, que esteve possuída por sete demônios, parece que procedia de Magdala, na margem oeste do lago, enquanto o possesso de Mc 5.1 saqueava as tumbas da margem leste (perto de Gergesa?), na região da Decápolis. Esta zona teve pouca importância para o AT.

3.3.2.3 – O VALE DO JORDÃO

Entre o lago da Galiléia e o mar Morto, numa distância de uns 105 km, o rio Jordão desce de 205 metros abaixo do nível do mar Mediterrâneo para 400. Em ambas as margens se elevam as montanhas de mais de 300 metros sobre o vale. Esta depressão se alarga em uns 30 km ao norte e ao sul, nas imediações do lago da Galiléia e do mar Morto. Quando dispõe de água suficiente, procedente das chuvas no norte e da irrigação no sul, este solo é apropriado para intenso cultivo.
No centro da depressão corre o rio Jordão, estreita corrente de 18 a 25 metros de largura no lugar em que Josué cruzou o rio (http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Jord%C3%A3o). Não é de estranhar que o sírio Naamã tenha julgado melhores os rios da Síria (2 Rs 5.12). Devido às suas curvas e meandros, especialmente na metade do caminho entre o lago da Galiléia e o mar Morto, o Jordão deposita espessas camadas de sedimento chamado Zor. Em alguns lugares o Zor tem uma largura de 1,5 km e uma espessura de 45 cm. O Zor costuma inundar-se na primavera, quando as águas do degelo do Hermom enchem as gargantas do Jordão, dando origem a um impenetrável matagal, que na antiguidade dava guarida a animais selvagens, como o leão (Jr 49.19; Zc 11.3. Jeremias insiste, com razão, no perigo que correm aqueles que adentram as selvas do Jordão (12.5; 49.19). O inseguro destas formações e a espessura dos matagais do Zor tem feito do Jordão uma divisória natural, mais que a largura de sua corrente d’água. No norte, onde os vaus são mais freqüentes, há melhores comunicações entre a Palestina e a Transjordânia, sobretudo em Gileade (Jz 8.4;12.1-6; 21.8-12; 1 Sm 31.11-13).
Avançando do norte para o sul pelo vale do Jordão, encontramos o primeiro grande afluente do rio Jordão ao leste, o Jarmuque, que leva tanta água como o próprio Jordão (e que deu motivo à “guerra das águas” entre árabes e israelenses em conseqüência de projetos hidráulicos destes últimos) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Jarmuque). Perto da confluência do Jarmuque com o Jordão floresceu uma importante civilização neolítica que tem deixado mostras abundantes de cerâmica.  A uns 20 km ao sul do lago da Galiléia há uma falha nas montanhas ocidentais, onde a planície de Jezreel/Esdrelom se abre sobre a depressão do Jordão. As rotas estratégicas de comunicação com Israel através desta abertura estavam controladas pela fortaleza de Bete-Seã ( Js 17.11), cuja importância se mostra nos estratos arqueológicos que têm revelado uma ocupação egípcia, filistéia e israelita. No período romano recebeu o nome de Citópolis, e no ano 400 se encontravam nelas duas florescentes comunidades, cristã e judia. Frente à falha de Bete-Seã, sobre a ladeira transjordânica do vale, estava Pela (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Giord/01GiordEs.html#Pella). Na direção sul se achava a torrente de Querite (waadi Yabes: 1 Rs 17.3), cuja desembocadura no Jordão assinala o território em que atuava Elias.
No lado leste, onde a depressão se estreita e no lugar em que o wadi Kufringe desemboca no Jordão, estava a localidade de Zaretã ( 1 Rs 4.12), onde também foram feitas interessantes escavações. No lado leste do vale, entre o wadi Kufringe e o Jaboque (Nahr ez-Zerka) tiveram lugar as atividades metalúrgicas empreendidas por Salomão (1 Rs 7.45-47), para as quais se usava abundante combustível dos bosques do norte de Gileade. A distância entre Zaretã e Adão (Tell ed-Damiyeh), na confluência com o Jaboque, é de uns 20 km. Js 3.16 relata que quando Josué deteve as águas do Jordão, a corrente deixou de fluir desde Adão até Zaretã. Notícias históricas parecem confirmar que  corrimentos de terra ocorridos na zona de Adão podem deter, temporariamente, o curso do Jordão. No lado ocidental, em frente a esta zona, o wadi Far’ah se adentra na depressão procedente da Palestina, trazendo as águas da região samaritana. Em um pico isolado, dominando a conjunção entre o Fa’ah e o Jordão, estava a impressionante fortaleza herodiana de Alexandreion. Nos 24 quilômetros que separam o Alexandreion de Jericó, na margem oeste, havia outras fortalezas herodianas, como Fasaelis, Arquelais e Doc (cf. 1 Mac 16.15), cuja finalidade era proteger as rotas que comunicavam o vale com a Judéia.
Cerca de 13 km ao norte do mar Morto, um pouco isolada na margem ocidental, estava a pérola sul do Jordão, Jericó, uma das cidades mais antigas do mundo e lugar de importantíssimas escavações arqueológicas (http://pt.wikipedia.org/wiki/Jeric%C3%B3 http://www.bibleplaces.com/jericho.htm (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/TS/03b_TSes.html ). Sugere-se que a fonte próxima às suas ruínas seja a que purificou a Eliseu (2 Rs 2.19-22). É muito possível que a Jericó do NT já não ocupasse mais o mesmo lugar (Tell es-Sultan), e sim, outro lugar próximo. Na zona leste, frente a Jericó, onde o vale é muito largo, se estendem as CAMPINAS DE MOABE (Nm 22.1), onde acamparam os israelitas quando voltavam da meseta moabita. Estas campinas foram o cenário dos últimos capítulos de Números e de todo o Deuteronômio. Não se sabe exatamente o lugar da passagem do Jordão. A região foi palco da atividade de João Batista e do batismo de Jesus. Jo 1.28 localiza a atividade de João Batista nas proximidades de Betânia, 5 km ao norte do mar Morto.

3.3.2.4 – O MAR MORTO

O rio Jordão termina seu curso desembocando no mar Morto, o mais característico acidente de toda a depressão do Jordão. Rodeado de montanhas em ambas as margens, com 80 km de comprimento por 16 de largura, o mar Morto, ou mar de Arabá (Dt 3.17), mar Salgado (Gn 14.3) e lago Asfaltite (Josefo) é o lugar mais baixo da superfície terrestre. A superfície do Mar morto está a 392 metros abaixo do Mar Mediterrâneo, com profundidades de 390 metros na parte norte. O Mar Morto possui a massa de água mais insólita do planeta. 27% de seus componentes são materiais sólidos (sal e outros minerais). Seu conteúdo salino aumenta incessantemente, pois os sete milhões de toneladas de água que desembocam nele diariamente não têm saída, mas se perdem por evaporação, acumulando os sólidos residuais (http://www.bibleplaces.com/deadsea.htm).
Os 45 milhões de toneladas de compostos químicos que contêm têm atraído a indústria química de Israel e da Jordânia. Mesmo assim não se pode evitar que o extremo sul do mar, pouco profundo, vá se elevando progressivamente devido à sedimentação. Nenhum peixe pode sobreviver em semelhantes águas, ao menos até que se cumpra a visão de Ezequiel e uma torrente portadora de vida desça de Jerusalém para adoçar o mar Morto até En-gedi (47.10). O calor excessivo e o solo requeimado não permitem assentamentos de população em grande escala nesta região, embora se preste atuamente para o turismo de inverno.
Na margem noroeste, perto da fonte de Ain Feshka, estão as ruínas de Qumrã, assentamento da comunidade que produziu os manuscritos do mar Morto, provavelmente os essênios (http://www.bibleplaces.com/qumran.htm)(http://www.bibleplaces.com/qumrancaves.htm). Perto dali, na margem oeste, se encontra a famosa fonte de En-gedi (Ct 1.14) (http://www.bibleplaces.com/engedi.htm) (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/TS/04a_TSes.html), onde Davi buscou refúgio fugindo de Saul (1 Sm 23.29). A fortaleza isolada de Massada, situada num platô elevado mais ao sul, foi o último bastião da luta que os judeus mantiveram contra os romanos entre 66 e 73 d.C. (http://www.bibleplaces.com/masada.htm)(http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/TS/04b_TSes.html). Os vales entre En-gedi e Massada abundam de cavernas, que proporcionaram abrigo para a resistência judaica. Nelas também se encontraram parte dos manuscritos do mar Morto. No extremo sul da margem oeste se encontra a montanha de sal chamada Gebel Usdum, cujo nome lembra a cidade bíblica de Sodoma e a coluna de sal em que se transformou a mulher de Ló (Gn 19.26). Alguns supõem que Sodoma e Gomorra, assim como outras três cidades da região (Gn 18.16ss), foram tomadas pelas águas, no extremo sul do mar.
A margem leste está cortada por precipícios abruptos e por grandes gargantas que conduzem os rios da Transjordânia, como o Arnom e o Zerede. Já mencionamos as fontes termais de Callirhoe na parte norte desta região. Baixando para a margem leste, a dois terços do caminho, se encontra a península de Lisã (= língua), de uns 15 km de largura, que se adentra no mar, reduzindo a largura do mar a apenas 3 km. Durante a época romana e ainda em tempos posteriores era possível atravessar o mar Morto por este lugar.

3.3.2.5 – O ARABÁ

No AT também se emprega o termo Arabá para designar toda a depressão palestinense. Hoje, sem dúvida, se usa este termo para designar a parte mais ao sul da depressão, ou seja, os 150 km que separam o mar Morto do Golfo de Ácaba. O solo do Arabá se eleva progressivamente até que no Gebel er-Rishe, a meio caminho, alcança os 195 metros acima do nível do mar. O vale se encontra flanqueado de montanhas, que são mais altas na parte leste. A partir do Gebel er-Rishe, o solo volta a descer até a altura do Golfo de Ácaba. A parte norte do Arabá é muito larga, especialmente na altura do entrante de Punom (http://www.bibleplaces.com/punon.htm).  Sua maior largura no sul não chega a 10 km. Quase todo o Arabá é um deserto, onde assentamentos humanos só podem sobreviver graças ao trabalho de irrigação, como o realizado pelos nabateus antigamente ou pelos israelitas na atualidade.
O Arabá adquire importância para a história bíblica em duas ocasiões. Primeiramente serviu de caminho para o avanço de Israel desde Cades-Barnéia até a Transjordânia, como já descrevemos. Em segundo lugar, foi o lugar em que se instalou a principal fundição de cobre nos tempos de Salomão. O mineral era extraído de colinas e fundido em lingotes para satisfazer as necessidades do grande construtor de Israel. No extremo sul do Arabá se acha a fortaleza de Elate, motivo de freqüentes disputas entre Judá e Edom ( 2 Rs 14.22;16.6). Perto dali ficava Eziom-Geber, um dos locais por que passou a peregrinação de Moisés, mas mais conhecida por haver sido transformada em porto por Salomão, que a converteu ainda em ponto de partida de suas frotas que comerciavam com a Somália, a Arábia do Sul e outros pontos situados a leste (1 Rs 9.26;10.2). Este porto voltou a ser usado em tempos posteriores, durante a monarquia separada de Israel e Judá, quando a paz entre ambos permitia unir esforços para continuar o comércio mundial empreendido por Salomão( 2 Cr 20.36).
N. Glueck tem identificado Elate e Eziom-Geber ( que na Bíblia aparecem como localidades distintas) com o lugar que ele mesmo escavou em Tell el-Kheleifeth, no centro do extremo norte do Golfo, meio quilômetro terra adentro. Quase todos os autores têm aceitado esta identificação, apesar de que Glueck não tenha encontrado restos de instalações portuárias. Os fortes ventos da região representam outra dificuldade. Há que supor que não se havia feito instalações normais para o atraque dos navios, e sim que estes simplesmente ancoravam na praia. 1 Rs 1 22.47 refere-se a um naufrágio em Eziom-Geber. Rothenberg sustenta que Elate ficava na zona nordeste do Golfo, e que Eziom-Geber ficava sobre a ilha de Jeziret Fara’un , a uns 13 km da costa, na direção sul. Esta ilha, onde se encontrou cerâmica correspondente aos tempos de Salomão, oferece excelentes condições de abrigo para os barcos. São visíveis nela os restos de um porto artificial.

3.3.3 – AS PLANÍCIES COSTEIRAS

            Antes de fixarmos nossa atenção na região mais importante da geografia bíblica, que é a faixa formada pelas montanhas da Palestina, entre o mar Mediterrâneo e o rio Jordão, vamos fixar-nos na costa da Palestina, que mede uns 200 km da cidade filistéia de Gaza, no sul, até a cidade fenícia de Tiro, no norte. Para maior clareza vamos dividi-la em três sessões, cada uma delas cobrindo uma distância de 60 a 70 km.

            3.3.3.1 – A FILISTÉIA E A SEFELÁ

            Meio século após a principal ocupação israelita de Canaã (ca. 1200 a. C.), os  povos do mar ocuparam uma faixa ao sul da costa cananéia. Estes novos invasores eram uma mistura de indo-europeus, procedentes de Creta, Chipre, Sicília e outras ilhas do Mediterrâneo. Estes povos haviam atacado anteriormente a costa situada mais ao norte, destruindo Ugarite. Os semitas que habitavam o país, cananeus e israelitas, encontraram nestes estrangeiros incircuncisos uns formidáveis adversários, cuja língua lhes era desconhecida e que chegavam portando armas de ferro que os tornavam invencíveis. Estes povos, que adiante seriam conhecidos com o nome de filisteus, se apoderaram em poucos anos de toda aquela costa, seguramente com a anuência do Egito, formando uma pentápolis ou liga integrada por cinco cidades (1 Sm 6.4): Gaza, Ascalom e Asdode/Azoto na costa, Gate e Ecrom terra adentro(lugares que ainda não foram claramente identificados).
            Mesmo que os filisteus tenham chegado a dominar boa parte de Canaã, incluindo a planície de Esdrelom/Jezreel e parte do vale do Jordão, a FILISTÉIA propriamente dita abarcava o território da pentápolis. A costa compreendida entre o norte de Gaza e Jope (uns 72 km) está coberta por dunas de areia, que às vezes alcançam uma altura de 50 metros. Ao longo da costa passa a estrada principal que unia o Egito com a Síria. Já sugerimos que este possa ter sido um dos caminhos pelo qual seguiram, em parte ao menos, os israelitas que saíram do Egito em direção a Canaã.
            A planície filistéia se estende entre as dunas de areia e as colinas, numa largura de 7 a 15 km, cruzada pelos wadis que drenam as colinas situadas a leste. Muitos deste wadis têm ajudado a localizar as cidades. Olivais e trigais eram a base da riqueza dos filisteus (Jz 15.5), sendo seus únicos perigos a seca, as pragas e as guerras. Especialmente no sul da Filistéia a água é escassa, e a que cai no inverno corre rapidamente para o mar. Gaza, por exemplo, se encontra no limite entre a terra fértil e o deserto, ao sul. Eram freqüentes ali as pragas que vinham do Egito (Dt 7.15; 28.60; Am 4.10). A Bíblia recorda uma epidemia (talvez de peste bubônica) que se propagou pela Filistéia quando a arca de Israel foi levada para Asdode e Ecrom (1 Sm 5). Quatro séculos mais tarde, um exército de Senaqueribe seria dizimado por uma destas pragas em Libna, ao norte de Gate (2 Rs 19.8,35-37). No que se refere às guerras, na Filistéia eram muito conhecidos os exércitos invasores, já que este país era passagem obrigatória para os que intervinham nos conflitos entre o Egito, no sul, e a Síria, Assíria e Babilônia no norte e leste do Crescente Fértil. No apogeu deste povo, o motivo das perturbações não eram as guerras internacionais, e sim, a rivalidade com Israel (séculos XII-XI). Não se fala mais dos filisteus no período pós-exílico, mas seu nome sobrevive no termo “Palestina”, utilizada pelos romanos para designar o território israelita após a revolta de Bar-Kochba contra Roma (132-135).
             Entre a planície filistéia e as montanhas de Judá a leste, há uma faixa com largura de 15 a 25 km, com altitude de 100 a 400 metros, conhecida como SEFELÁ (=terras baixas). Os vales de Sefelá eram passagens naturais entre a Filistéia e as montanhas, e eram protegidos por cidades fortificadas: Debir ( Js 15.7), Laquis (Js 10.5,23) (http://www.bibleplaces.com/lachish.htm), Libna (Js 15.42), Azeca (Js 15.35), Maquedá (Js 15.41), Bete-Semes ( 1 Sm 6.9-19) (http://www.bibleplaces.com/bethshemesh.htm) e Gezer (Js 10.33) (http://www.bibleplaces.com/gezer.htm), uma lista de cidades que ficaram famosas pelos relatos bíblicos de temas bélicos. As escavações realizadas em Bete-Semes dão a conhecer importantes mostras da indústria filistéia. Elas mostram que estas cidades deviam cair alternadamente sob influência israelita e filistéia. Quando Josué consolidou seu domínio sobre as terras altas da Canaã central, com base em Betel, Ai e Gabaom, sua próxima campanha se dirigiu contra as cidades da Sefelá (Js 10.28-40). As escavações realizadas em algumas delas confirmam sua destruição em ca. de 1240 a.C.
Quando os filisteus chegaram lá, serviram-se de Ecrom e Gate como fortalezas contra Israel (Js 15-16). As vitórias de Davi, que romperam definitivamente o poderio filisteu, tiveram lugar em SEFELÁ (2 Sm 5.17-25). Em uma palavra: o controle da Sefelá era decisivo. Quando prevaleciam os filisteus, os wadis eram como flechas que apontavam para as montanhas de Judá; quando os israelitas se impunham, a ameaça se voltava contra a planície dos filisteus. Mais tarde, nos séculos VIII a VI, o controle desses wadis desempenhou um papel decisivo nas campanhas da Assíria e da Babilônia contra Judá. Ao invés de atacar a planície pelo norte, Senaqueribe e Nabucodonosor enviaram seus exércitos na direção sul, ao longo da costa, para cortar qualquer ajuda que Judá pudesse receber do Egito e para dispor ao mesmo tempo de uma via de acesso fácil para o interior. Laquis foi lugar de famosas e importantes batalhas ( 2 Rs 18.14; Jr 34.7).
            Dois wadis situados na parte norte da Sefelá merecem especial menção. O Soreque (Jz 16.4) tinha em suas imediações as cidades de Quiriate-Jearim (http://www.bibleplaces.com/kiriathjearim.htm), Bete-Semes, Ecrom e Jabneel. Foi cenário dos relatos sobre Sansão (Jz 16) e da história da arca que caiu nas mãos dos filisteus (1 Sm 6; 2 Sm 6). O outro wadi, mais ao norte, era o Aijalom, que, passando por Bete-Horom de Baixo e Bete-Horom de Cima, dava acesso a Betel e Jerusalém através de Gabaom. Neste lugar Josué travou suas batalhas com os reis do sul (Js 10.10-15). O vale teve grande importância estratégica nas lutas de Saul contra os filisteus (1 Sm 14.31), assim como na guerra entre jordanianos e israelitas em 1948.

            3.3.3.2 A PLANÍCIE DE SAROM

A planície de SAROM é uma faixa de uns 65 km que vai de Jope (Jafa), no sul, até o rio do Crocodilo (Sior-Libnate), no norte. A planície de Sarom é mais estreita (uns 15 km de largura) que a planície filistéia. Não se forma aqui uma verdadeira “sefelá “ de suaves colinas, pois as planícies alcançam a base de elevadas montanhas. De norte a sul, ao longo da planície, se elevam em meio a ela uma elevação formada por rochas arenosas. Os wadis que descem das montanhas se vêm forçados a desviar seu curso para rodear um dos extremos desta elevação, de forma que três destas torrentes, incluindo o rio Crocodilo, desembocam na parte norte da planície, enquanto que no sul desemboca o rio Jarcom, perto da cidade atual de Tell Aviv.
            A configuração do terreno nesta região significava uma série de obstáculos desalentadores para viajar ou estabelecer-se nela. A rota principal que a atravessava seguia pela base das montanhas. Poucas cidades se instalaram na borda da planície: Jope, Lida, Afeque, Gilgal e Socó. Afeque (talvez a romana Antipátrida de At 23.31), junto ao nascimento do rio Jarcom, era um lugar importante para controlar a rota que levava de Jope a Jerusalém (http://www.bibleplaces.com/aphek.htm). Ali sofreram os israelitas uma grande derrota para os filisteus por volta de 1050 (1 Sm 4.1), se bem que parece mais correta a localização mais ao norte, perto de Esdrelom. Jope, “a formosa” tinha importância como zona portuária, mesmo que sua utilização não fosse muito cômoda (http://www.bibleplaces.com/joppa.htm). Provavelmente as madeiras de cedro utilizadas na construção do templo foram levadas em jangadas até a costa de Jope, de onde eram enviadas por terra para Jerusalém (2 Cr 2.16; Ed 3.7). Na atualidade, Tell Aviv (nome que recorda Ez 3.15), fundada por judeus em 1909 por causa da hostilidade dos árabes instalados em Jafa, é a maior cidade do país.
            Nos tempos do NT, a planície se tornou mais transitável graças às estradas e pontes construídas pelos romanos. Pedro atua tanto em Lida como em Jope (At 9.32-10.23). Uns 16 km ao sul de Jope se encontra Jabne ou Jâmnia, onde se instalou uma escola rabínica e o Sinédrio após a queda de Jerusalém em 70 d.C. e por volta de 90 se definiu a cânon hebraico do AT (http://pt.wikipedia.org/wiki/Conc%C3%ADlio_de_Jamnia). Na costa e ao extremo norte de Sarom, Herodes Magno mandou construir Cesaréia Marítima, proporcionando à região um novo porto, cuja necessidade se fazia sentir. Em At 9.30; 18.22; 21.8 lemos que Paulo embarcou e desembarcou nele. Cesaréia era o centro do poder romano na Palestina e nela estava o quartel general do procurador. A primeira inscrição descoberta na Palestina com uma menção a Pôncio Pilatos foi encontrada aqui em 1961. O centurião Cornélio, da coorte itálica, vivia em Cesaréia (At 10.1) e ali foi batizado por Pedro. Entre os anos de 58 a 60 o apóstolo Paulo sofreu prisão em Cesaréia sob os governadores Félix e Festo (At 23.23;25.12) e tanto de Herodes Agripa I (At 12.20-25) como do II (At 25.13-27) se diz que foram a Cesaréia nos anos 44 e 60, respectivamente (http://www.bibleplaces.com/caesarea.htm).
            Em tempos modernos, os árabes fizeram plantações de cítricos na planície de Sarom, que receberam novos impulsos através dos israelenses. A Bíblia diz que nesta região se criavam animais (1 Cr 27.29; Is 65.10). Sua abundante vegetação é comparada com a do Carmelo ou do Líbano (Is 33.9; 35.2).

            3.3.3.3 A COSTA DE DOR E A PLANÍCIE DE ASER

            A zona costeira de DOR separa o Sarom do grande promontório do Carmelo, uns 30 km ao norte do rio do Crocodilo. Como ocorre em todo o norte, a costa, de apenas 3 km de largura, é muito mais estreita que no sul (Sarom ou Filistéia). As montanhas chegam muito próximas do mar. A cidade de Dor, que deu nome ao território, era um porto medíocre. Não foi tomada na invasão de Josué (Jz 1.27) e seguiu em mãos dos filisteus até o século X (1 Rs 4.11). Desde que Herodes construiu Cesaréia Marítima, 13 km ao sul, a cidade de Dor entrou em contínua decadência.
            O mais notável acidente geográfico da costa palestinense é o promontório do CARMELO, que adentra no mar e forma a baía natural que abriga os portos de Haifa e Aco. A vista que se desfruta do Carmelo sobre a baía é fascinante. Neste ponto teve lugar o dramático enfrentamento de Elias com os sacerdotes de Baal (1 Rs 18.20ss) (http://www.bibleplaces.com/mtcarmel.htm). Haifa ganha importância como porto apenas durante o mandato britânico. Não é uma cidade bíblica, embora nela foram achados antigos assentamentos. Aco era uma antiga cidade. Com o nome de Ptolemaida ( 1 Mac 11.22-24; 12.45-48; At 21.7) fez-se importante na época greco-romana por seu artesanato de vidro. Os cruzados a usaram como porto com o nome de São João de Acre, tendo sido a única fortaleza que permaneceu em seu poder depois de terem sido derrotados por Saladino. Aqui desembarcou São Francisco de Assis para fundar a “Custódia da Terra Santa” franciscana, encarregada de proteger os santuários cristãos (http://www.bibleplaces.com/acco.htm).
            Mais ao norte se encontra a planície de ASER. O território previsto para a tribo de Aser tinha uns 20 km de comprimento por 8 de largura e se achava encaixado entre o mar e as montanhas. A planície estava inundada em grande parte pelas águas que desciam das montanhas pelos leitos dos wadis. Ao pé das montanhas estavam os assentamentos mais importantes. Nem a tribo de Aser nem o seu território tiveram importância para a história bíblica, se bem que Gn 49.20 menciona as possessões de Aser como uma terra muito rica capaz de proporcionar alimentos aos reis (Dt 33.24). Em Jz 5.17 se conta como Aser foi castigado por ficar junto ao mar, quando o resto de Israel estava em perigo. Era inevitável que as pobres costas de Aser ficassem na penumbra ao lado da FENÍCIA, com quem se limitava ao norte, com seus grandes portos de Tiro e Sidom (http://pt.wikipedia.org/wiki/Tiro). Parece que Aser formava parte dos territórios entregues por Salomão a Hirão de Tiro, em pagamento pelos materiais e ajudas prestados pelos fenícios na construção do templo (1 Rs 9.11).

            3.3.4 – A REGIÃO CENTRAL DA PALESTINA

            Para a história bíblica, esta é a região mais importante da Palestina. A região entre Dã e Berseba era vista como o “autêntico Israel”. Comecemos pelo sul.

            3.3.4.1 – O DESERTO DO NEGEV

            Este é o território situado no extremo sul de Israel. Tem a forma aproximada de um trapézio, delimitado por Gaza, o ribeiro do Egito, Eziom-Geber e Sodoma, flanqueado a oeste pela costa do deserto e a leste pelo vale do Arabá. O NEGEV (=sul) é conhecido na Bíblia como o deserto de Zim (Nm 20.1; 33.36: é possível que este nome se refira mais exatamente à parte sul do Negev, no limite com Cades-Barneia). Seguindo a direção nordeste-sudoeste, em diagonal, através do Negev, se encontram duas elevações de terreno que recebem os nomes de Kurashe e Kurnub. A parte oeste destas elevações, particularmente o noroeste, recebe alguma umidade proveniente do orvalho e das chuvas ocasionais procedentes do Mediterrâneo. A isto se deve o fato de que quase todas as localidades habitadas do Negev estejam situadas precisamente no flanco ocidental, como Berseba e Cades-Barnéia. Na atualidade, os israelitas têm conseguido restaurar o sistema de irrigação utilizado antigamente pelos nabateus, tornando a região novamente produtiva.
            A parte leste e sudeste do promontório, ou seja, aquela que se volta para o Arabá, é deserta e  cruzada por profundas gargantas. A importância desta região está no fato de que todo o comércio procedente da Transjordânia, (por exemplo, Petra, no tempo dos nabateus) ou do golfo de Ácaba (por exemplo, Eziom-Geber nos tempos de Salomão) tinha que passar necessariamente por estas gargantas e wadis em seu caminho para Berseba e para a Palestina propriamente dita. A cidade de Kurnub (a Mampsis romana) estava situada numa falha do promontório, pela qual passavam as rotas de caravanas (http://www.bibleplaces.com/mampsis.htm). Hormá, cujo nome está relacionado à intenção frustrada dos israelitas de invadir Canaã a partir do sul (Nm 14.39-45; 21.1-3; Dt 1.41-46), achava-se provavelmente nesta zona, a sudeste de Berseba.
            Em tempos bíblicos, o Negev só pôde ser controlado pela monarquia em seus momentos de maior esplendor, e ainda assim, somente na medida precisa para manter abertas as rotas comerciais em direção a Eziom-Geber. No restante, o Negev era cenário de expedições de saque organizadas por beduínos contra as populações da Filistéia e de Judá e de incursões de castigo ao estilo das ações narradas em 1 Sm 27.8-12;30. Estes relatos das incursões de Davi no Negev mostram que este se achava dividido em diferentes zonas de influência. Após a queda da monarquia, os edomitas ocuparam o território, de onde procede o nome de IDUMÉIA que lhe foi dada no período helenista (1 Mac 5.3; Mc 3.8). Em 125 a.C. o João Hircano conquistou a Iduméia e submeteu-a ao poder do estado judaico dos asmoneus. Dentre eles surgiu a família herodiana, que governaria em diferentes territórios palestinenses durante cerca de um século. A região voltou a ter certa importância na época bizantina, como demonstram algumas escavações recentes em Avdat ou Abda (http://www.bibleplaces.com/avdat.htm).
            Os dois lugares bíblicos mais importantes do Negev eram Cades-Barnéia e Berseba. Cades-Barnéia foi o lugar onde os israelitas se detiveram por 38 anos em sua viagem entre o Sinai e a Transjordânia (Dt 1.46; 2.14). Miriam, a irmã de Moisés, morreu e foi enterrada neste lugar (Nm 20.1). Dt 1.2 localiza Cades-Barnéia a uma distância de onze dias do Sinai-Horebe. Este dado corresponde à localização do Sinai no sul da península do mesmo nome. O nome Cades tem se conservado no de Ain Qudeis, junto à fronteira entre a península do Sinai e a Palestina. Supõe-se que esteja relacionado com Cades o episódio em que Moisés faz brotar água de uma rocha, para acalmar a sede do povo (Nm 20.2-13). Por isso são muitos os investigadores que identificam Cades não com Ain Qudeis, e sim, com a localidade de Ain Qudeirat, já que na primeira a água era escassa.
            A uns 80 km ao norte de Cades estava Berseba, famosa já pelas estadias de Abraão e Isaque nela (Gn 22.19; 26.33; 46.1-4) (http://www.bibleplaces.com/beersheba.htm). Localizada a uns 300 metros acima do nível do mar e abastecida abundantemente de água, a cidade se encontra sobre as rotas procedentes de Gaza para o oeste, da Transjordânia para o leste e do Negev para o sul. No deserto próximo vagou Hagar com Ismael (Gn 21.4). Em Berseba plantou Abraão uma tamargueira, dedicando-a ao culto de El Olam (Gn 21.33). Uns 30 km a leste de Berseba se encontra Arade, uma das cidades cananéias situadas mais ao norte dentro do Negev, cujo rei se opôs à passagem dos israelitas (Nm 21.1-3).Quando estes destruíram a cidade, seu território foi entregue aos aliados quenitas (Jz 1.16 ?;cf. Js 12.14). Atualmente se fazem importantes escavações em Arade (http://www.bibleplaces.com/arad.htm).
            O Negev ou deserto de Zim era a parte mais ao sul dos domínios israelitas (Nm 34.3; Dt 34.3; Js 15.1). Às vezes se designa esta fronteira a partir do extremo sul do Negev ou do ribeiro do Egito (wadi el Arish: Nm 34.5; Js 15.4). Mais freqüentemente se traça a fronteira a partir de Berseba, no norte do Negev (Jz 20.1; 1 Sm 3.20).

            3.3.4.2 – O TERRITÓRIO DA CASA DE JUDÁ

            O país de Judá ou a JUDÉIA é uma faixa montanhosa que forma uma meseta elevada, de uns 15 km largura, que se estende desde o norte de Berseba até um pouco mais adiante de Jerusalém. A leste, onde a meseta desce para o mar Morto e para a depressão do Jordão, está o desolado DESERTO DE JUDÁ (Js 15.61; Mt 3.1), refúgio de bandidos e fugitivos (por exemplo, Davi fugido de Saul), assim como de homens religiosos que buscavam a solidão (João Batista, os sectários de Qumrã, os monges cristãos do mosteiro de  Mar Sabas). A desolação deste deserto se mostra no fato de que entre Jerusalém e Jericó não há um único manancial de água. A defesa de Judá por este lado oriental podia ser deixada quase por conta da natureza. Pelo oeste, a Sefelá flanqueava as montanhas e dificultava o avanço dos filisteus (http://www.bibleplaces.com/judeanwilderness.htm).
            Pelo sul, as elevações montanhosas desde Berseba ofereciam uma defesa, mesmo que um tanto débil, frente às incursões dos moradores do Negev, como os amalequitas (1 Sm 15). O Negev de Judá (1 Sm 27.10) era provavelmente a zona norte do Negev, sobre a qual Judá tentava manter um certo controle para que lhe servisse de proteção pelo sul. Por isso o Negev, às vezes, aparece como parte do território de Judá (Js 15.3-4). A tribo de Judá, que possivelmente entrou na Palestina pelo sul, e não cruzando o Jordão, parece que se aliou com um grupo de povos estabelecidos no sul, como os quenitas,os quenezeus, os calebitas e os jaramelitas ( Js 14.6-15; 15.13-19; Jz 1.8-20;1 Cr 2.9,25-27), incluindo-os na confederação israelita.
            A fronteira norte de Judá não estava tão clara. Se bem que o território de Benjamim ficasse ao norte de Judá, ele era um limite mais político que geográfico. Por sua história e seus sentimentos, Benjamim se inclinava para Efraim e não formava parte da “casa de Judá”. O território de Benjamim em torno de Ai e Gibeom foi o primeiro ponto de apoio ganho por Josué nas montanhas da Palestina quando os israelitas subiram de Jericó (Js 7-9). Este território tinha grande importância estratégica não só olhando para o leste, como também para o oeste, como o demonstra o fato de que Josué se viu obrigado a manter uma guerra permanente com os reis da Sefelá, que subiam do lado oeste pelo vale de Aijalom para atacar Israel. Os filisteus usaram esta mesma rota para destroçar Saul e atacar as fortalezas israelitas das montanhas de Benjamim (1 Sm 10.5;13.1-14.31). A terra natal e capital de Saul foi Gibeá (1 Sm 10.26;11.24), a moderna Tell el-Full, ao norte de Jerusalém.
            Quando se dividiu a monarquia, Benjamim parece que se uniu ao norte, como uma das dez tribos  confederadas contra as do sul, Judá e a extinta Simeão (1 Rs 11.30). Porém Judá precisava do território de Benjamim como um amortecedor defensivo para Jerusalém, aspiração que vemos refletida na menção de Benjamim nas glosas de 1 Rs 12.21,23 ( “toda a casa de Judá e a tribo de Benjamim). As reivindicações territoriais de Judá abarcavam desde Berseba, ao sul, até Geba, no norte. Porém Geba, a uns 8 km de Jerusalém, caía no território de Benjamim (2 Rs 23.8). Judá resistiu tenazmente ao propósito das tribos do norte de anexar esta zona de Benjamim( 1 Rs 15.16-24). A importância desta fortaleza fronteiriça de Benjamim para a defesa da fronteira norte de  Judá  fica bem ilustrada no relato imaginário de como um rei assírio poderia atacar Jerusalém (Is 10.28-34) avançando desde Ai, 15 km ao norte de Jerusalém, até Nobe, sobre o Monte das Oliveiras, e dominando Jerusalém.
            Entre as cidades de Judá, Hebrom foi o centro histórico do poderio de Judá, do que Davi implicitamente daria testemunho ao fazer-se coroar ali como o rei de Judá (2 Sm 2.1-4; cf. 15.7-10). Estabelecida a uns mil metros sobre o mar, é a cidade de Judá situada em maior altitude. Ela controlava pelo oeste as rotas que levavam a cidades como Maressa (Js 15.44) e Laquis (Js 10.5), na Sefelá, e pelo leste a rota que levava a En-gedi. Parece que antes Hebrom se chamava Quiriate-Arba (Js 14.15;15.13). Nela Abraão e Sara foram sepultados (Gn 23; 25.9). No santuário próximo de Manre (a moderna Ramet- el-Khalil), Abraão recebeu as promessas divinas e viu a Deus ( Gn 13.14-18). Também Isaque morreu em Hebrom (Gn 35.27). Hoje as tumbas destes patriarcas são veneradas numa mesquita, outrora uma igreja, que se levanta em meio a Hebrom, junto a magníficas ruínas herodianas. O tanque de Abraão recorda o lugar em que Davi mandou executar os assassinos de Is-Bosete, filho de Saul (2 Sm 4.1-12) (http://www.bibleplaces.com/hebron.htm).
            Belém (nome anterior:Efrata), a uns 24 km de Hebrom e a 8 km ao sul de Jerusalém, não era uma cidade importante em si (Mq 5.2). Ganhou notoriedade por ser a pátria ancestral de Davi (Rt 1.1; 4.22;1 Sm 16; Lc 2.4; Mt 5.2; Jo 7.42). Sobre a gruta tradicionalmente relacionada com o nascimento de Jesus se levantou uma basílica constantiniana, depois modificada pelos cruzados. O campo que se estende ao leste de Belém pode ser muito bem o “campo de pastores” de Lc 2.8,15. A “tumba de Raquel”, que atualmente se acha na entrada norte da cidade, é prova de um erro devido a uma interpretação equivocada de Gn 35.19; 48.7 e a uma afirmação implícita em Mt 2.18. O sepultamento de Raquel no território de Benjamim é muito mais verossímil (1 Sm 10.2; Jr 31.15) (http://www.bibleplaces.com/bethlehem.htm).
            A sudeste de Belém se levanta uma colina em forma de cone, o Herodeiom, a fortaleza em que Herodes Magno foi enterrado, não longe da mesma cidade cujas crianças, segundo Mt 2.6, mandou matar (http://www.bibleplaces.com/herodium.htm). Daqui até o mar Morto se estende uma região com alguma pastagem, ocupada pelos beduínos  Ta’amireh, os mesmos que descobriram os manuscritos do mar Morto. Perto estava Técoa, pátria do profeta Amós (1.1).
            Jerusalém, “a cidade do grande rei” (Sl 48.2), caiu nas mãos de Judá apenas nos tempos de Davi (ca.1000). Após conquistá-la dos jebuseus, Davi transferiu sua capital de Hebrom para Jerusalém (2 Sm 5.6-10). Enquanto Hebrom era uma cidade sulista e de caráter provincial, Jerusalém estava situada no limite entre ambas as porções de Israel, sem antecedentes históricos que a ligassem a uma delas. Em Gn 14.18 se fala de sua pré-história como santuário de El Elyon (Deus Altíssimo) e talvez de Zedeque (cf. Js 10.1).
            O monte sobre o qual a cidade estava situada está rodeado por barrancos em três lados. Ao leste há uma forte inclinação para o Cedrom, wadi que transporta uma rápida corrente d’água quando caem fortes chuvas. Esta depressão separa Jerusalém do monte das Oliveiras, mais alto, de onde se tem uma visão esplêndida da cidade (2 Sm 15.23,30; 2 Rs 23.6; Jo 18.1). Apesar de estreito, o vale do Cedrom é identificado tradicionalmente com o vale de Josafá, onde Jl 3.2-12 situa a reunião de todas as nações para serem julgadas. A oeste de Jerusalém se encontra o vale de Hinom (Js 15.8;18.16), que rodeia a parte sul da montanha para encontrar-se com o Cedrom ao sudeste, no Haceldama. Este vale (=Ge-Hinnom/Gehenna) trazia à memória lembranças desagradáveis, já que era usado como local em que se queimava lixo e já que nele se havia tributado culto a deuses pagãos (1 Rs 11.7; 2 Rs 16.3; 23.10), de onde se derivou o significado de gehenna como “inferno”(Mt 5.22). O promontório de Jerusalém se dividia em duas colinas, a leste e a oeste, por uma ribanceira que hoje mal se nota: o Tiropeón (“vale dos queijeiros”). A cidade cananéia (jebuséia) tomada por Davi estava situada no extremo sul da colina leste, no lugar em que o Tiropeón e o Cedrom vão se aproximando para unir-se ao Hinom (http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Ger/indexCa.html).
            A colina ocidental é a mais alta e impressionante das que formam a cidade de Jerusalém. Durante séculos ela foi identificada como Sião ou Jerusalém antiga. Hoje se admite que a cidade de Davi e Salomão estava sobre a colina leste. Davi conquistou a parte sudeste da colina, e Salomão levou os limites da cidade mais para o norte, sobre a mesma colina, ao edificar o templo, no local em que tradicionalmente se tem localizado o monte Moriá, local do sacrifício de Isaque (Gn 22.2; 2 Cr 3.1) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Templo_de_Jerusal%C3%A9m). O lugar do templo está assinalado atualmente pela mesquita de Omar, ou “Cúpula da Rocha” (http://www.bibleplaces.com/domeofrock.htm).
            O lado norte de Jerusalém era o único que não estava protegido por uma ribanceira, e a expansão da cidade sempre se realizou nesta direção. Nas sucessivas ampliações se foram construindo diferentes muros defensivos, três dos quais Josefo destaca em primeiro plano (GJ 5.4). A solução sobre lugar do sepulcro em que foi posto o corpo de Jesus (morto e ressuscitado fora da cidade: Jo 19.20,42) depende de onde se localiza o muro exterior correspondente a aquela época. Os muros impressionantes da Jerusalém Velha que hoje se vê foram construídos durante a dominação turca (século XVI) sobre alicerces do tempo de Herodes (ver fotos sobre Jerusalém e arredores em http://www.bibleplaces.com/ e http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/Ger/indexCa.html).
            Lc 1.39 situa a pátria de João Batista nas montanhas da Judéia, segundo a tradição, em Ain Karim, a oeste de Jerusalém. Betânia, terra de Lázaro, Maria e Marta, “perto de Jersualém uns 15 estádios” (Jo 11.1-18), onde Jesus residiu algumas vezes quando de suas visitas a Jerusalém (Mc 11.1; 14.3), é a Ananias de Ne 11.32 e a moderna Azaruyeh, a leste de Jerusalém e que rodeia o monte das Oliveiras em seu extremo sul. Recentes escavações na moderna Ramat Rahel, ao sul de Jerusalém, pôs a descoberto uma fortaleza real do século VII a.C., que talvez seja o luxuoso palácio de Jeoaquim ( Jr 22.13-19).

            3.3.4.3 – O TERRITÓRIO DA CASA DE JOSÉ

            Avançando uns 65 a 75 km para o norte a partir do limite de Judá se chega à faixa montanhosa que durante cinco séculos (1220-720) foi domínio da casa de José, ou seja, das tribos josefitas de Efraim e parte de Manassés (Gn 48). Este grupo tribal foi o mais importante entre os rivais que disputavam com Judá a supremacia na Palestina israelita. Quando o povo de Israel entrou na Palestina sob as ordens de Josué, as tribos mais fortes, Efraim e Manassés, ocuparam as montanhas centrais. As mais fracas tiveram que contentar-se com as zonas que ladeavam as montanhas (por exemplo, Benjamim e a localização original de Dã), ou com o território situado na Galiléia (Issacar, Naftali, Zebulom, Aser), ou ainda com a Transjordânia (Rubem, Gade). Estas zonas eram muito mais inseguras, expostas a contínuos ataques. Isto obrigou-as a muitas guerras defensivas, impedindo que as tribos menores chegassem a aumentar seu poder.
            Em Jz 8.1;12.1 aparecem claramente as aspirações de Efraim no período dos juízes. O primeiro intento frustrado rumo à realeza foi o de Abimeleque, filho de Gideão, da tribo de Manassés (Jz 6.15;9). Mais tarde, no ano 922, Jeroboão I, um efraimita, encabeçaria a secessão das tribos do norte para construir um reino separado (1 Rs 11.26; 12). O emprego do nome “Efraim” pelos profetas para referir-se a todo o reino do norte indica suficientemente que esta tribo detinha o poder naquela região (Os 6.4; Is 11.13). Concedeu-se às tribos de Efraim e Manassés, descritas como “príncipe entre seus irmãos” (Dt 33.16), os “melhores frutos das montanhas antigas e a abundância dos outeiros eternos”(Dt 33.15), o que, sem dúvida, não impediu que as duas tribos aspirassem ainda a  mais (Is 9.20-21).
            Durante a história antiga, EFRAIM foi a tribo preponderante na casa de José (Gn 48.20), mesmo que Manassés fosse mais numerosa. Note-se como Efraim assinala qual há de ser o território de Manassés em Js 16.9. Efraim possui a metade meridional do território atribuído a José. Seus domínios se estendiam desde uns 30 km ao norte de Geba, em Benjamim, até Tapua e a região em que as montanhas começam a descer até a rica planície em torno de Siquém (Js 17.8-9). A Bíblia designa a esta faixa, de uns 30 km de largura, de MONTANHAS DE EFRAIM (Jz 17.1;1 Sm 1.1), formada por colinas que chegam a alcançar altitudes de 300 a 900 metros. A chuva é abundante nesta área e o solo é fértil, razão pela qual abundam nela as árvores frutíferas e as oliveiras. Excetuando o limite sul, no qual não há uma fronteira natural que separasse Efraim de Benjamim, a pendente da meseta efraimita em direção à planície de Sarom a oeste, a depressão do Jordão a leste e o território de Manassés ao norte formavam uma defesa natural. Suas cidades mais importantes eram Betel e Silo.
            Betel, que Js 16.1 atribui à casa de José, estava justamente sobre a fronteira benjamita e a uns 15 km ao norte de Jerusalém. Chamada em outros tempos de Luz (Js 18.13), Betel foi um santuário no tempo dos patriarcas e como tal figura nos ciclos narrativos de Abraão e Jacó (Gn 12.8; 13.3-4; 28.10-22; 35.1-16). As escavações realizadas em Betel demonstram que ela foi arrasada no século XIII, notícia que talvez corresponda à afirmação de Jz 1.22: “A casa de José subiu contra Betel”. Betel foi um santuário e local de reunião no tempo dos juizes (Jz 20.18). No intento de voltar à “religião dos tempos antigos”, Jeroboão, a raiz do cisma de 922, fez de Betel, junto com Dã, um dos santuários nacionais do reino de norte, rejeitando assim as pretensões davídicas e judaítas de erigir a Jerusalém como o santuário principal (1 Rs 12.26-29; 13.11). O culto de Betel, assim como o de Jerusalém, corrompeu-se com superstições. Amós (7.10-17) fustigou aqui o povo e Oséias mudou seu nome para Bete-Áven(=casa da maldade: 4.15;5.8).
            Silo, que se levantava sobre uma plataforma rochosa no centro do território efraimita, teve sua maior importância na época dos juizes. Era um lugar em que as tribos se reuniam em assembléia ( Js 22.9,12; Jz 21.19ss) e ali esteve a arca da aliança durante muito tempo, guardada num edifício permanente ( 1 Sm 1; 4.4). Foi destruída pelos filisteus em ca. de 1050, pouco depois da batalha de Afeque/Ebenezer, sendo reduzida a um monte de ruínas (Jr 7.12-14;26.9). De Silo saiu o profeta Aías que ungiu a Jeroboão e anunciou a divisão do reino salomônico (1 Rs 11.29) (http://www.bibleplaces.com/shiloh.htm).
            O sacerdote e profeta Samuel era de Ramataim-Zofim (Ramá), na parte oeste de Efraim (1 Sm 1.1). É possível que no tempo do NT seja aqui a localização de Arimatéia, de onde procede José, que recolheu o corpo de Jesus e lhe deu sepultura (Lc 23.50-51), já que Arimatéia é o nome grego de Ramá.
            Quanto ao território controlado por MANASSÉS, ele adquire maior importância a partir da independência do reino do norte, em 922. A região ondulada de Manassés é mais baixa que a de Efraim, com apenas alguns montes que se elevam até 600 metros. Formando uma faixa de uns 25 a 30 km de largura, Manassés se estende do norte de Efraim até alcançar a planície de Esdrelom. O território possui ricas planícies e graciosos vales. Se bem que o solo não seja tão fértil como o de Efraim, o clima permite colheitas abundantes de grãos. Os limites naturais de Manassés estavam menos determinados que os de Efraim. As cidades de maior interesse eram Siquém, Tirsa, Samaria e Dotã.
            Ao sul de Manassés está a planície de Mane. Sua parte oeste está cercada pelas altas montanhas de Gerizim (881 metros) e Ebal (940 metros). Entre estas duas montanhas, na direção centro-oeste, há um vale que a natureza converteu em passagem obrigatória para as rotas que unem Judá e Efraim com o norte. Na entrada deste vale se encontra Siquém (a moderna Balata), a mais importante cidade bíblica vetero-testamentária depois de Jerusalém (http://www.bibleplaces.com/shechem.htm).
            Siquém foi o primeiro lugar cananeu visitado por Abraão, e já então se considerava o “carvalho de Moré” como um local sagrado (Gn 12.6). Quando Jacó regressou de Harã, instalou-se em Siquém (Gn 33.18-19). Este foi o local que logo se daria aos filhos de José (Gn 48.22: uma porção= em hebraico, sekem). Siquém se achava em mãos israelitas muito provavelmente antes da invasão capitaneada por Josué (é possível que por detrás do relato etiológico de Gn 34 se esconda a notícia de uma conquista anterior a Josué). Aqui também, entre os montes Ebal e Gerizim, foi renovada a grande aliança de Javé com Israel (Dt 11.29-30; 27; Js 8.30-35; 24). Durante o tempo dos juízes, parece que se praticou aqui um culto misto. Isto se poderia depreender da notícia de que os homens da cidade apoiaram a Abimeleque em suas aspirações à realeza com dinheiro procedente do templo do “Baal-Berite=Baal da Aliança) ou do “El-Berite=El da Aliança” (Jz 9.4,46).
Em Siquém, as tribos do norte elegeram a Jeroboão I como rei, ao invés de submeter-se a Roboão, filho de Salomão (1 Rs 12.1-25). Jeroboão transformou Siquém, por certo tempo, em capital de seu reino. Mesmo depois que a administração e o poder foram deslocados para  Samaria, Siquém continuou sendo  o centro em que se celebrava a renovação da aliança. Nos tempos do NT, Jesus se deteve junto aos muros de Siquém para beber, entabulando a conversa com uma mulher samaritana (Jo 4.4-42). Este relato nos lembra que o monte Gerizim, em frente a Siquém, era o local do templo samaritano e um lugar sagrado para aquele povo. Atualmente os samaritanos sobrevivem em Nablus, a Neápolis romana, edificada a uns 3 km mais a oeste, no mesmo vale. Por ocasião da Páscoa, sobem ao cume do Gerizim para imolar os animais necessários para a sua festa, único resto dos sacrifícios sangrentos de Israel (http://www.bibleplaces.com/samaritanpassover.htm).
            Ao norte de Siquém se encontra Tirsa (Tell el-Far’ah), próxima à nascente do grande wadi Far’ah, que desce para o sudeste a caminho do Jordão. Desde os tempos de Jeroboão até Onri (910-870), esteve instalada aqui a capital do reino do norte ( 1 Rs 14.17; 15.21,33;16.6-23). Sua localização a convertia em lugar estratégico para a defesa de Manassés pelo leste, já que o wadi Far´ah era uma rota natural de invasão  (é possível que alguns grupos israelitas usaram esta rota para ocupar Canaã. Isto pode explicar a confusão de textos como Dt 11.30;27.4; Js 8.30, onde se dá a entender que, logo ao cruzar o Jordão, os israelitas chegaram ao Ebal e Gerizim. Aqui teríamos um novo indício de que houve mais de um processo de ocupação do território).
            Cruzando para o oeste pelo vale do Ebal e Gerizim e logo dobrando para o norte, chega-se à majestosa colina de Samaria, sucessora de Tirsa e a maior das capitais do reino de norte. (Podemos formar uma idéia de quão curtas são as distâncias ao notar que Tirsa está a uns 11 km ao norte de Siquém, e que Samaria está à mesma distância desta cidade na direção noroeste). Onri mudou-se de Tirsa para Samaria (ca. 870: 1 Rs 1.16.24) em parte por razões geo-políticas. Tirsa estava protegida por montanhas em seu flanco oeste, mas exposta a invasões procedentes do leste, especialmente da Síria, principal inimigo de Onri. Samaria estava no outro lado destas montanhas, que formavam uma barreira contra os inimigos procedentes do leste. Samaria, por outra parte, contava com rotas na direção noroeste, onde a Fenícia, nova aliada de Israel, tinha seus ricos portos com grandes possibilidades comerciais.
             Situada sobre uma colina isolada, sobre a qual se erguiam as magníficas construções de Onri e de seu filho Acabe, Samaria deve ter sido a mais bela de todas as cidades israelitas (cf. Is 28.1). A cidade dominou no reino do norte a tal ponto que Israel pôde ser chamado pelo nome de “Samaria”,  assim como se aludia frqüentemente a Judá com o nome de Jerusalém (Ez 16.46). Para o leitor da Bíblia é importante distinguir entre a cidade e o distrito da Samaria. Este último é o território de Manassés ou, às vezes, todo o reino do norte. Inclusive após sucumbir frente aos assírios em 722, a cidade conservou sua importância estratégica como capital, sucessivamente, de uma província assíria e persa (Ed 4.17; Ne 3.33-34) e de um distrito sírio (1 Mac 10.30).
Herodes Magno reconstruiu a cidade como Sebaste, em honra ao imperador Augusto (sebastos, em grego), porém o distrito continuou se chamando de Samaria. Quando o NT alude à Samaria, refere-se ao território situado ao norte da Judéia (At 1.8; 8). Nos últimos séculos antes de Cristo chamava-se de “samaritanos” não apenas aos habitantes da Samaria, mas também aos adeptos de uma forma desviada de judaísmo centrada no monte Garizim (http://www.bibleplaces.com/samaria.htm).
             Adiante de Samaria, continuando para o norte de Manassés, a rota principal levava a Dotã, cidade que protegia a baixada desde Manassés até a planície de Esdrelom. Eliseu esteve em Dotã (2 Rs 6.13).

            3.3.4.4 – A PLANÍCIE DE JEZREEL/ESDRELOM

As montanhas e colinas da casa de José estavam separadas da Galiléia, domínio das tribos mais nortistas, por um largo vale que corre na direção noroeste-sudeste desde a baía de Haifa até a depressão do Jordão. A maior parte deste vale, desde o mar até o monte Gilboa (uns 32 km) é designado pelo nome de Esdrelom, reservando a designação de Jezreel para a parte leste, entre o monte Gilboa e a bacia do Jordão, atravessando a colina de More através da depressão de Bete-Seã. Já que “Esdrelom” é a forma grega de “Jezreel”, parece melhor designar as duas partes com os nomes de Esdrelom (ou Jezreel) ocidental e oriental.
            A ESDRELOM OCIDENTAL chega a alcançar em alguns pontos mais de 30 km de largura. Sua altitude vai subindo de 25 até 100 metros sobre o nível do mar perto de En-Ganim (Js 19.21). Pela planície corre o rio Quisom, a caminho do mar. Esta é a maior extensão de terras cultiváveis em toda a Palestina. Quando os israelitas chegaram do deserto sonhando com a terra que mana leite e mel e se aproximaram deste lugar, devem ter exclamado: É aqui!. Esdrelom tinha uma grande importância estratégica do ponto de vista nacional e internacional (http://www.bibleplaces.com/jezreelvalley.htm).
            Em termos internacionais, passava pela planície de Esdrelom a principal rota de comunicação entre o Egito e a Síria. A parte sudoeste da planície estava flanqueada pela cadeia montanhosa do Carmelo. Os exércitos ou caravanas que percorriam a costa vindos do Egito, passando pela Filistéia e pela planície de Sarom, tinham que utilizar uma das quatro passagens que franqueavam a cadeia do Carmelo para chegar à planície. Para guardar estas passagens, edificaram-se quatro fortalezas na região: Jocneão (Js 12.22), Megido, Taanaque (Jz 5.19) e Jibleão. A rota que passava por Megido era a mais importante de todas, como o confirma uma notícia egípcia: “A tomada de Megido equivale à tomada de mil cidades”. Em 1468, o maior de todos os faraós egípcios, Tutmosis III, ganhou uma batalha contra os restos dos hititas, que lhe serviu para cimentar seu império universal. Salomão, e mais tarde os reis do norte, fortificaram esplendidamente a cidade de Megido (1 Rs 9.15). Josias, o mais piedoso dos reis de Judá, morreu aqui em 609, ao tentar impedir a passagem de exército egípcio (2 Rs 23.29). Não é de estranhar que o vidente do Apocalipse tivesse situado neste lugar a grande reunião final das nações dispostas a entabular o último conflito universal (Ap 16.16:em hebraico har Megido, “monte Megido”, Armagedom em grego) (http://www.bibleplaces.com/megiddo.htm).
            Em termos nacionais, a planície de Esdrelom também foi importante. Enquanto esteve nas mãos dos cananeus (Jz 1.27), as tribos do norte (Issacar, Zebulom, Naftali e Aser) permaneceram separadas da casa de José. No tempo dos juízes houve uma série de batalhas para assegurar o controle da planície. No século XII, Débora e Baraque conseguiram unir as tribos do norte às de José para lutar contra Sísera e os cananeus. Quando o rio Quisom transbordou, inundando a planície e inutilizando os carros dos cananeus, os israeliats venceram em Taanaque (Jz 4.7;5.20-21). A vitória dos filisteus sobre os israelitas em Afeque/Ebenézer, em 1050 (1 Sm 4) assegurou aos primeiros o controle das planícies de Sarom e Esdrelom. O mesmo ocorreu quando derrotaram a Saul (ca.1000) em Gilboa ( 1 Sm 29.1;31).
            O monte Gilboa demarca uma segunda parte da planície em direção à depressão do Jordão, que às vezes se chama de vale de Jezreel, ou vale de Bet-Shean, e que nós denominamos de ESDRELOM ORIENTAL. Este corredor era a rota principal para prosseguir viagem de Esdrelom ocidental para o vale do Jordão, Transjordânia e Damasco. A Esdrelom Ocidental se estende na direção sudeste por uns 20 km, com uma largura de 3 km, chegando a 300 metros de altitude no início, entre Gilboa e Moré, até que alcança o vale do Jordão. Dada sua situação como passagem entre a Palestina e a Transjordânia, a Esdrelom Oriental serviu muitas vezes como rota de invasão. Na batalha liderada por Gideão contra os saqueadores midianitas, aquele acampou sobre o monte Gilboa em Harode, na ladeira sul deste corredor, enquanto que os midianitas se instalaram em frente, sobre a colina de Moré (Jz 6.33; 7.1). Exatamente as mesmas posições ocuparam Saul e os filisteus (1 Sm 28.3ss). Saul passou de noite entre as linhas dos filisteus para consultar a feiticeira de En-dor, justamente ao norte de Moré. Tão logo Saul foi derrotado em Gilboa, os filisteus regressaram pela mesma passagem e penduraram seus corpos sobre os muros de Bete-Seã (1 Sm 31.8-10).
             Quando Onri e Acabe fixaram a capital do reino do norte em Samaria, souberam apreciar a beleza e a importância estratégica do vale de Esdrelom, edificando uma residência na cidade de Jezreel, junto à entrada oeste do corredor que leva a Bete-Seã. Aqui tiveram lugar o trágico episódio da vinha de Nabote e a morte desastrosa de Jezabel ( 1 Rs 21.1; 2 Rs 9.30; 10.11). O profeta Oséias deu o nome de Jezreel a seu filho, significando assim a ameaça de um castigo divino que pesava sobre aquele lugar pelos crimes que nele se havia cometido (Os 1.1-4). Oséias viu aqui também uma promessa divina de fertilidade (2.22-23).
            Na época do NT, consigna-se a passagem de Jesus pela planície de Esdrelom quando ele ressuscitou o filho da viúva de Naim, cidade situada na ladeira norte da colina de Moré (Lc 7.11-17). A nordeste dele se acha o monte Tabor, solitário e simétrico (http://www.bibleplaces.com/mounttabor.htm  http://pt.wikipedia.org/wiki/Monte_Tabor). (A proximidade de ambas as elevações tem feito a muitos intérpretes pensar que o “Tabor e o Hermom” do Sl 89.12 seriam em realidade o Tabor e o Moré; deste mal entendido provém o costume de chamar o Moré de “pequeno Hermom”). O Tabor serviu de ponto em que se juntavam os limites fronteiriços entre Zebulom, Naftali e Issacar. Este provavelmente é o motivo de Baraque  juntar suas forças no Tabor (Jz 4.6). Do Tabor se domina a entrada que leva de Esdrelom para o lago da Galiléia, e Jesus deve ter percorrido esta rota em suas viagens a partir de Nazaré. É o lugar em que, tradicionalmente, mas com rara probabilidade, se localiza a “montanha alta” do episódio da transfiguração (Mc 9.2).

            3.3.4.5 – A GALILÉIA

            Cruzando a planície de Esdrelom em direção ao norte, chegaremos a uma região que figura muito pouco na história do AT. Nela, porém, na perspectiva cristã, se cumprem todas as aspirações do AT. Na parte norte de Esdrelom se elevam as colinas da Galiléia, e 5 km adentro está Nazaré, onde Jesus passou a maior parte de sua vida (http://www.bibleplaces.com/nazareth.htm). Situada entre Esdrelom e Dã, a GALILÉIA se estende por uns 50-65 km de sul a norte, e por uns 30-40 km de leste a oeste. A oeste estava a planície costeira de ASER. Pelo leste se chega à depressão do Jordão, ao lago da Galiléia e à parte superior do rio Jordão. Há uma Alta Galiléia ao norte, e uma Baixa Galiléia ao sul. Ambas estão divididas por uma falha na direção leste-oeste, que corre aproximadamente desde Aco (Ptolemaida) até o limite norte do lago da Galiléia.
            A BAIXA GALILÉIA (ou Galiléia do Sul) é formada por formosas colinas que não chegam a exceder os 600 metros de altitude. Em alguns lugares ela se parece muito com a Sefelá do sul. Nos tempos do AT, a maior parte da Baixa Galiléia esteve ocupada por Zebulom, Aser, junto à costa, Issacar a sudeste e Naftali ao norte e a leste. Zebulom funcionava como um amortecedor entre estas tribos, o que lhe deu uma posição proponderante na área. Parece que a Galiléia se manteve à margem da vida israelita, a julgar pelos relatos do AT. Galiléia caiu nas mãos dos assírios depois da guerra siro-efraimita de 735 (2 Rs 15.29). Isaías (9.1-2) refere-se ao território de Zebulom e Naftali como “Galiléia dos gentios”, prometendo que aquele povo, sumido nas trevas, veria uma grande luz (cf. também Mt 4.15-16). Durante o período helenista foi numerosa a população de judeus naquela região (1 Mac 5.9-23). Sem dúvida, durante o ministério de Jesus, quando a Galiléia era governada por Herodes Antipas, os judeus “puros” da Judéia, que se achavam sob o controle de um procurador romano (Lc 3.1), a tratavam com certo desdém (Jo 7.52).
            O terreno da Baixa Galiléia está salpicado por pequenos vales regados por águas que descem das colinas. O solo destes vales são de aluvião, muito fértil, enquanto que as cidades se encontram nas faldas das colinas. Esta paisagem está vivamente descrita nas parábolas de Jesus: campos separados por sebes e cercas de pedra, rebanhos que pastam em colinas, cidades situadas no alto dos montes, etc. Duas das cidades da Baixa Galiléia, Nazaré e Canaá, estão encravadas na borda de ricos vales. Caná não corresponde seguramente ao atual local de peregrinação, Kefr Kenna, a uns 5 km a nordeste de Nazaré, e sim, mais provavelmente a Khirbet Qana, 14 km ao norte de Nazaré. Jotapata, não mencionada na Bíblia, onde Josefo foi derrotado e capturado pelos romanos, está muito próxima. A principal cidade nos tempos do NT era Séforis, capital de distrito, sobre a rota que levava de Aco/Ptolemaida a Tiberíades (http://www.bibleplaces.com/sepphoris.htm). A escola pós-bíblica de Bet-Shearim, na planície de Esdrelom, se mudou finalmente para Séforis, onde o rabi Judá, o Príncipe, passou os últimos dezessete anos de sua vida codificando a Mishná. Galiléia foi, portanto, a cunha do cristianismo e do judaismo pós-bíblico.
             Quanto à ALTA GALILÉIA (ou Galiléia do Norte), a configuração do solo é bem diferente, com áreas mais montanhosas e altitudes que alcançam 900-1200 metros. Características desta região são as fortes chuvas e o vento. Em realidade, aqui começa a elevar-se a cadeia do Antilíbano, que segue em direção ao norte. Esta área não tem importância  para o AT e o NT, exceto como lugar de refúgio, pois as alturas inacessíveis ofereciam a possibilidade de resistência a poderosos exércitos. Giscala foi um foco de tenaz resistência judaica contra os romanos. Dali procedia João (de Giscala), inimigo de Josefo. Safed, sobre o cume de uma montanha (Mt 5.14) e que oferece uma visão esplêndida até o lago de Hule e o lago da Galiléia, e Gamla, também figuram nos episódios da sublevação judaica (http://www.bibleplaces.com/gamla.htm). Por volta de 1500, Safed se converteu em centro de uma nova colonização judaica. Sua escola de mística produziu o Shulhan Aruk e algumas importantes exposições da Cabala. A mística de Safed foi o último broto do zelo de Deus de que este pequeno país tem sido, durante séculos, um testemunho excepcional.
(Texto baseado, sobretudo,  em Robert NORTH/Raymond E. BROWN e Joachim GONZÁLES, indicados na bibliografia abaixo).

BIBLIOGRAFIA

a) Textos sobre geografia bíblica
CESAR, Éber M. Lenz. História e geografia bíblica. São Paulo: Candeia, 2002.  (acompanha CD com mapas e fotografias da Palestina).
ECHEGARAY, Joachim Gonzáles. O Crescente Fértil e a Bíblia. Petrópolis: Vozes, 1995.
LAMADRID, Antonio Gonzales. La fuerza de la tierra: Geografia, historia y teologia de Palestina. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1981.
LAEPPLE, Alfred. A bíblia hoje: Documentação de História, Geografia e Arqueologia. São Paulo: Paulinas, 1979.
NORTH, Robert; BROWN, Raymond E. Geografia Bíblica. In: Comentário San Jeronimo. Tomo V Estúdios Sistematicos, p. 347-396.
TERRA, João E.M. Geografia bíblica. In: Revista de Cultura Bíblica. 16, 61-62, 1992, p. 8-20)
THEISSEN, Ged. Los evangelios y su situacion genética. In: Colorido local y contexto histórico em los evangelios. Salamanca: Sigueme, 1997, p. 259-320.
b) Mapas, atlas e outros recursos visuais
GALBIATI, Eurico; ALETTI, Aldo. Atlas histórico da Bíblia e do Antigo Oriente. Petrópolis: Vozes, 1991.
PACOMIO, Luciano; VANETTI, Pietro. Pequeno Atlas Bíblico: história, geografia e arqueologia da Bíblia. Aparecida: Santuário, 1996.
PEREGO, Giacomo. Atlas bíblico interdisciplinar: Escritura, história, geografia, arqueologia, teologia: análise comparativa. São Paulo: Paulus, 2001.
SERVIÇO DE ANIMAÇÃO BÍBLICA. Mapas e temas bíblicos. São Paulo: Paulinas, 2001. (42 transparências com mapas e temas bíblicos.Acompanha um pequeno texto explicativo).
MAPAS. São Paulo: Paulinas, 1987 (coleção de mapas bíblicos, elaborados por períodos cronológicos).
- http://www.cpad.com.br/paginas/sub_mapa_1.htm (mapas bíblicos em português)
- http://www.biblemap.org/  (BibleMap é um Atlas Bíblico que usa fotos de satélite e  mapas do Google para indicar localidades bíblicas. Funciona assim: primeiro se escolhe um capítulo da Bíblia, que está em inglês. Os nomes das localidades mencionadas no capítulo aparecem em forma de links. Clique sobre um link e a localidade é visualizada no Google Maps - como é atualmente e não no tempo bíblico. Então, pode-se clicar sobre a localidade e aparecerão informações sobre ela, além de se poder usar o zoom e a navegação pelo mapa típica do Google Maps ).
http://www.painsley.org.uk/re/Atlas/default.htm (Atlas Bíblico elementar, com mapas dos impérios antigos e vários mapas de Israel, do período do Antigo e do Novo Testamento).
- http://www.bibleplaces.com/ (Belíssima coleção de fotografias e descrições de importantes sítios em Israel, Jordânia, Egito,Turquia e Grécia, com ênfase na arqueologia, geografia e história bíblicas).
- http://www.david-guerrero.com/viajes/orientemedio2003/index.html (site com belas forografias da Síria, Líbano, Jordânia e Palestina).
- http://198.62.75.4/www1/ofm/sbf/escurs/index.html (roteiros de excursão, em três línguas,  para cidades e sítios arqueológicos de interesse bíblico, com pequenos textos explicativos e boas fotografias, organizado por franciscanos).
- http://www.stg.brown.edu/projects/Inscriptions/ (Este projeto quer colecionar e tornar disponíveis todas as inscrições da terra de Israel de 330 a.C. até 614 d.C. Feito por Michael L. Satlow).
- http://www.bearport.org/SatMap/ (O Interactive Satellite Map of the Holy Land é um programa gratuito para ser instalado no computador do usuário e que oferece um mapa de Israel em alta-resolução, feito por satélite, com indicação das mais importantes localidades bíblicas. Quando o nome de uma localidade é clicada no menu que fica à esquerda, ela aparece no mapa. Clicando sobre o seu nome aparece uma janela pop-up com a descrição, fotos e citação bíblica da localidade. O download gratuito do mapa pode ser feito em formato .exe ou em formato .zip, à escolha.
- http://www.usm.maine.edu/~maps/exhibit1/  (Mapas que ilustram a história de Jerusalém na celebração de seus 3000 anos como capital do reino davídico. Alguns mapas são antigos, outros são idealizados a partir de interpretações dos textos bíblicos e outros são objetivos, fundamentados em dados históricos. Da University of Southern Maine).
- http://darkwing.uoregon.edu/~atlas/europe/maps.html (Mapas da Universidade do Oregon. São nítidos, coloridos e carregam rapidamente. Alguns deles são interativos. Valiosos para o estudo do mundo greco-romano onde nasceu e se desenvolveu o cristianismo).
- http://www.inisrael.com/3disrael/index.html (site com tours virtuais)
- http://www.jerusalemshots.com/Jerusalem_en62-6137.html   (belíssimas fotos de Jerusalém)
(Verner Hoefelmann)





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