FUNDAÇÃO DOM JAIME
DE BARROS CÂMARA
INSTITUTO TEOLÓGICO
DE SANTA CATARINA - ITESC
PROVÉRBIOS: UMA
INTEGRAÇÃO ENTRE O SECULAR E O RELIGIOSO?
Aluno:Osmar Debatin
Disc: Sapienciais
Curso: Teologia - III ano
Prof: Luis Dietrich
Florianópolis SC,
Março de 2002.
PROVÉRBIOS: UMA INTEGRAÇÃO ENTRE O SECULAR E O
RELIGIOSO?
“Pelas ruas e avenidas a sabedoria faz ouvir a sua voz” (Pr
1,20).
ESBOÇO:
1.0) Terminologia e natureza dos Provérbios
2.0) Os Provérbios na Bíblia e na Literatura universal
3.0) Contexto dos Provérbios
4.0) Autoria do livro
5.0) Estrutura e datação
6.0) Conteúdo
7.0) Teologia do Livro
8.0) Questões para reflexão.
1.0) TERMINOLOGIA E NATUREZA DOS PROVÉRBIOS
A palavra "provérbios"
vem do latim "proverbium", formada por "pro" = antes
e "verbum" = palavra. O latim "pro" pode ter o sentido de
"de acordo com", ou "através de", e talvez seja essa a força
desse prefixo, nessa palavra. No hebraico, a palavra correspondente é "mashal",
que "significa propriamente "semelhança, comparação". O
mashal tem significado mais amplo que nosso provérbio, e inclui também o
sentido de sentença profunda e misteriosa, metáfora, parábola, alegoria, enigma,
sátira..."(STORNIOLO, 1991,p. 14).
Assim, um provérbio é uma
declaração expressiva, incisiva e concisa, embora com a intenção de transmitir
um pensamento novo ou importante. É uma declaração enigmática ou uma máxima,
como se fosse uma minúscula parábola ou símile. Ainda pode ser uma declaração
enigmática, que requer, meditação e análise para que possa ser definido ou
compreendido (ex 1,17) "é em vão, porém, que se estende a rede, sob os
olhos do que tem asas".
2.0) OS PROVÉRBIOS NA BÍBLIA E NA LITERATURA UNIVERSAL
a) No At: Encontramos provérbios
espalhados pela Bíblia inteira, mas o livro dos Provérbios é a coletânea
principal de provérbios, atribuídos a Salomão. Temos outros exemplos de provérbios
em: 1 Sm 10,11; 19,24 e 24,13, resumindo declarações proverbiais. Ainda em Jr
31,29, Ez 18,2 e o Livro de Jó, que sendo um livro poético, encera também
muitos provérbios (Jó 28,28).
b) No Nt: temos duas palavras
gregas, que são usadas e que podem ser traduzidas por "provérbio: “paraboléin"
em Lc 4,23 "e certamente ireis citar-me o provérbio: médico,
cura-te a ti mesmo"e "paroimisis",
como em Jo 16,25,29 "disse-vos essas coisas por figuras".
Jesus empregou provérbios em
seu ensino, como aquele de Lc 4,23. Paulo falou "em amontoar brasas
vivas sobre a cabeça de alguém" (Rm 12,20). Ainda, outros provérbios
de Paulo acham-se em 1 Cr 14,8; em Tito 1,12,15 e em 1 Tm 6,10. Nas Cartas
Pastorais, tem-se provérbios em Tg 2,26, 1 Pd 4,8 e na 2 Pd 2,22.
c) Nos outros povos: antes da
escrita ter sido inventada, os provérbios circulavam sob a forma verbal. "A literatura antiga
dos Sumérios, dos Babilônios, dos Egípcios, dos Gregos e dos Romanos contém
provérbios, o que também pode ser dito acerca dos Chineses, dos Celtas e de
outros povos" (CHAMPLIN, 2000, p. 2529).
3.0) CONTEXTO
Formular um provérbio não é apenas criar mais
uma frase bonita. Tem a ver com a vida de um povo. É o resultado de uma
descoberta. É como uma vitória após longa luta! Um provérbio reflete a experiência
de um grupo. Por isso, não tem dono, é anônimo. Hoje se fazem coleções de
dizeres que aparecem no pára-choque dos caminhões. O mesmo se fazia com os provérbios
do povo de Deus.
Os provérbios costumam nascer
onde a vida é simples, onde existe o relacionamento direto entre as pessoas.
Elas tratam das experiências e necessidades diárias: comer, beber, falar,
amar... Nascem da observação atenta da vida de um grupo de pessoas nos seus
setores:
· Casa: famílias,
tribo, corpo, saúde, educação, amor...
· Campo:
trabalho, plantio, animais, estações, tempo...
· Portão:
justiça, comércio, cidade, praça, feira...
· Palácio:
governo, organização, corte, exército, conflitos...
· Templo:
religião, culto, Deus, oração, romaria, promessa...
a) Pano de fundo:
Sem nos importarmos se a
autoria salomônica é aceita ou não, podemos concordar que o pano de fundo do
livro de Provérbios parece ter sido a corte de Jerusalém.
O pressuposto básico que
confirma esta hipótese é de que os
autores do livro de Provérbios usam a sabedoria e a retidão como sendo idênticas
e a iniqüidade é uma espécie de insensatez. Isso se torna axiomático no livro, dando-lhe um
colorido todo especial (Pr 10,2). A partir deste pressuposto, vem a tona outros princípios não menos
importantes: o temor de Javé, quem quer ser sábio precisa ter uma mente
disposta a aprender a instrução...
Esta capacidade de mostrar
sagacidade nos pensamentos, foi sempre admirada entre os israelitas que desde
antes de Salomão, os seus possuidores tornaram-se líderes naturais, bem
reputados na comunidade de Israel (2 Sm 14,2; 20,16). E quem demonstrou maior
habilidade, quanto a isso do que o próprio Salomão? (cf 1 Rs 3,16-28).
Portanto, com base no reconhecimento de que há homens dotados de tremenda
sagacidade mental, capazes de aplicar esta habilidade às questões práticas da
vida, que surgiu a literatura dos provérbios.
b) Lugar de origem e destinatários:
O livro de Provérbios
provavelmente originou-se nos círculos palacianos de Jerusalém. As porções
salomônicas (cf 25,1) podem ter sido registradas pelos escribas desse monarca,
descendente de Salomão. Quanto aos destinatários do livro, pelo seu conteúdo,
que visava a instrução dos filhos das famílias nobres, com instruções endereçadas
freqüentemente a "meu filho", intencionava-se também em pauta uma
audiência muito mais ampla, ou seja, todo o povo. "A sabedoria dos sábios
destinava-se a todos" (CHAMPLIN, 2000, p. 2532).
c) Canonicidade do livro:
No Cânon da Bíblia Hebraica,
fixado pelos judeus da Palestina por
volta da era cristã (90 dC), o livro dos Provérbios situa-se na parte dos Ketuvim
(ou dos Escritos ou Hagiógrafos), entre os livros de Jó e Rute. Na Bíblia Grega
(ou dos Setenta LXX), destinada aos judeus da Dispersão, o referido livro
encontra-se no grupo dos Livros Sapienciais.
4.0) AUTORIA
Tradicionalmente, o volume
maior do livro de Provérbios tem sido atribuído a Salomão, filho de Davi e rei
de Israel (cf Pr 1,1; 10,1; 25,1). Todavia, o mesmo livro contém outros autores
a saber: (seção 22,17 - 24,31 - as Palavras dos Sábios), Agur (30,1-14) e
Lemuel (31,1-9).
Pelo testemunho bíblico,
afirma-se que Salomão foi o autor da maior parte do volume do livro de Provérbios,
à qual foram acrescentadas as obras de outros autores. Essa atribuição a
autoria do livro, como sendo de Salomão, aconteceu porque este "adotou
não só o sistema político e econômico do Egito, mas também o modelo diplomático
e cultural. Esse modelo de assessoramento do governo era feito por sábios
profissionais, chamados de 'escribas', escrivões ou secretários (ver 1 Rs
4,3)". (STORNIOLO, 1991, p. 15).
Em síntese: com Salomão,
tem-se o início de uma literatura intencional.
5.0 ESTRUTURA E DATAÇÃO DO LIVRO
ý Há um NÚCLEO CENTRAL no livro reunindo as três coleções mais antigas:
1) Pr 10,1 - 22,16 é a “Primeira
Coleção de Salomão”
sendo que de 10,1 -
15,33 - ressalta o aspecto mais social e
de 16,1 - 22,16 - texto
mais exortativo.
2) Pr 25,1 - 29,27 é a “Segunda
coleção de Salomão”
sendo que de 25,1 -
27,27 - o destinatário é o povo e
28,1 - 29,27 - os
destinatários são os administradores
Estas duas coleções tomaram
esta forma no reinado de Josias, por ocasião da reforma empreendida pelo rei
(622 aC). No entanto, o trabalho de recolher provérbios vem da reforma
anterior, de Ezequias (715 - 687 aC), conforme mostra o livro (25,1). Os funcionários
da corte foram buscar a experiência administrativa das aldeias para fundamentar
as reformas empreendidas pelos reis. As atividades destes funcionários têm
portanto um fim claramente político: exaltar a figura do rei como administrador
competente (25,2-6).
3) Pr 22,17 - 24,22 - é
a coleção “As Palavras dos Sábios”
Com um pequeno apêndice Pr
24,23-34, chamado de “Estas também são Palavras dos Sábios”. No meio das
coleções anteriores, introduziram esta, que é considerada a parte mais antiga
do livro. Estas máximas, ou ensinamentos, foram trazidos do Egito e usadas na
formação dos funcionários e burocratas da corte real de Jerusalém.
Após o Exílio (587-539 aC),
este núcleo central descrito acima recebeu vários acréscimos de épocas difíceis
de datar. São elas:
a) Pr 1,1 - 9,18 - é o
Prólogo do livro e que dá o título: “Provérbios de Salomão filho de Davi e
rei de Israel”. É um longo discurso sistemático mostrando a evolução da
Sabedoria como guia do povo de Deus e com
a preocupação de atribuir todos os provérbios contidos no livro ao rei
Salomão.
b) Pr 30,1-14 e Pr
31,1-9 - são duas coleções de sábios estrangeiros, Agur e Lamuel, que
viviam em Massa, na Arábia.
c) Pr 30,15-33 - é uma
coleção de provérbios numéricos. Com um estilo todo próprio, estes provérbios
lembram as nossas adivinhações.
d) Pr 31,10-31 - é um
poema alfabético fazendo um elogia da mulher ideal. Mas a mulher ideal deve ser
entendida dentro do contexto patriarcal da época e não na nossa visão atual.
A reunião final de todas estas coleções num único
livro, deve ter terminado por volta do ano 400 aC, durante a reforma de Esdras.
6.0) CONTEÚDO
a) Os temas:
As duas formas literárias que mais prevalecem
no livro de Provérbios são: a) as declarações sucintas e expressivas usadas
para transmitir sabedoria e b) os longos discursos didáticos do que são
exemplos a primeira seção (cap 1-9) e as seções dos capítulos 30-31.
Em relação ao assunto,
genericamente encontramos três tipos de temas apresentados no livro: a) instruções
para que se abandone a insensatez e siga-se a sabedoria (cap 1-9); b) exemplos
específicos de conduta sábia ou de conduta insensata (cap 10-29) e c) a nítida
descrição acerca da mulher virtuosa (cap 31), que talvez contrabalance com o
motivo do filho sábio (cap 1-9).
Destaca-se ainda mais duas
particularidades do livro de provérbios: a) a figura da Sabedoria, que no
oitavo capítulo recebe um tratamento da "sabedoria como uma hipostatisação",
ou seja, a sabedoria aparece como atributo divino, mas sendo um ser que mantém
inter-relações com os homens e b) a relação entre o livro de Provérbios e a
obra egípcia "a Sabedoria de Amenemopê" (22.17-24,34), no qual destacam-se muitas
semelhanças entre as duas obras.
b) Características positivas
dos Provérbios
1.
Ajuda o povo a
sobreviver, a não se deixar derrubar pelos problemas.
2.
Faz conhecer a
natureza e suas leis, para que sirvam à vida.
3.
Organiza a vida:
ato criador continuado, defende contra o caos.
4.
Cresce de baixo
para cima: só aceita o que a prática comprova.
5.
Capacita
para a vida: não cria dependência, mas
faz descobrir.
6.
É realista: fruto
do bom senso e do respeito ao próprio povo.
7.
É crítica: ensina
a descobrir e ter consciência certa.
8.
É ecumênica:
internacional e interconfessional na sua origem.
9.
É anônima:
reflete a experiência do grupo, é a voz do povo.
10. É conservadora: conserva o que é bom para a vida do
povo.
c) Assuntos de destaque em Provérbios (ver anexo)
7.0) A TEOLOGIA
DO LIVRO
Além de considerar o livro de
Provérbios como sendo uma obra de sabedoria secular e prática, podemos inferir
a partir de seu conteúdo, que o livro é extremamente teológico, destacando-se:
· a onisciência de Deus (15,3,11; 21,2);
· Deus é apresentado como Criador de tudo (14,31; 17,5; 20,12);
· Deus governa a ordem moral do universo (10,27,29; 12,2);
· As obras dos seres humanos são aniquiladas por Deus (15,11; 16,2);
· O juízo moral é mais importante ainda que a prudência (17,23);
· O tema do "temor do Senhor" (1,7; 9,10), como sendo um
termo genérico para a idéia de 'religião'.
· O caráter vital da verdade (28,4; 29,18);
· O vocabulário "aliança", que mesmo ocorrendo uma única
vez em (2,16), mas a constância da relação entre pai e filho (3,12...), caracteriza
a idéia de aliança.
8.0) QUESTÕES
PARA REFLEXÃO
1) O que você pensa da integração do secular e
religioso presente no conteúdo e na estrutura do livro dos Provérbios? Este
esforço integrador faz parte da tarefa educacional da nossa Igreja, de seu
programa de educação popular?
2) Pr 1, 1-7
A partir deste trecho é possível explicitar a
finalidade do livro de Provérbios? Comente.
3) Pr 31, 10-31
O texto apresenta algumas qualidades da mulher. A
partir de uma leitura de gênero, mostre como a mulher descrita no texto é
submissa ao marido.
BIBLIOGRAFIA
1- CASCANTE
Fernando A. Provérbios: um manual pedagógico para nós. São Leopoldo:
Cebi, 1996, Série: A Palavra na Vida, n 108.
2- CHAMPLIN
R. Normam. O Antigo Testamento interpretado versículo por versículo. São
Paulo: Candeia, 2000, Vol 4.
3- COLEÇÃO
TUA PALAVRA É VIDA. Sabedoria e Poesia do povo de Deus. São Paulo:
Loyola, 1993, - CRB.
4- GRUEN W.
O tempo que se chama hoje. Uma introdução ao Antigo Testamento. 7. ed. São
Paulo: Paulinas, 1977.
5-
STORNIOLO Ivo. Como ler o Livro dos Provérbios. São Paulo: Paulinas,
1991.
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